Sancho Pança e o homem massa

O filósofo espanhol Ortega y Gasset definia o homem massa como aquele que não cultua nenhum valor e tem a ignorância como uma espécie de direito, que pode e deve impor ao próximo. Antes de seu surgimento, as pessoas tinham uma certa vergonha de sua própria ignorância e se recolhiam a um silêncio respeitoso, evitando opinar sobre o que desconheciam.

Tudo mudou na modernidade. O homem bate no peito, exalta sua ignorância e tem uma opinião sobre tudo. Não se trata de classe social, não é por ser pobre que se torne um homem massa; erro ainda pior, é achar que por ser rico está a salvo deste mal. Também não tem a ver com estudo. Há pessoas inteligentíssimas, doutores universitários, que são autênticos homens massa. Basta ver o que os chamados especialistas andam falando (especialmente os jornalistas).

Cervantes nos traz uma personificação maravilhosa do homem massa com Sancho Pança, o fiel escudeiro de Dom Quixote (este sim um homem autêntico e por isso mesmo incompreendido na modernidade). Sancho se vê como um pragmático e realista, mas no fundo é um idiota incapaz de se colocar limites. Culmina com a pretenção de ser um governante, tornando-se governador de uma ínsula, que por sua vez representa o Estado Nacional Moderno. 

Aliás, uma das características da modernidade é justamente o governo pelos homens massa. Quando vejo a foto dos líderes do G7 vejo um conjunto de Sancho Panças. Ignorantes que se vêem como capazes de lidar com temas complexos, como esta pandemia maldita. O mesmo acontece nas redações, universidades e burocracias estatais. 

E quando aparece uma pessoa pública com valores, o que não elimina suas imperfeições, é visto da mesma  maneira que Dom Quixote pela corte do Duque. Com desdém e afetação de superioridade.

Cervantes foi um gênio.

Um pensamento sobre “Sancho Pança e o homem massa

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