Cobertura da Veja sobre Honduras

A cobertura da Veja sobre o que está acontecendo em Honduras está a cargo de Thomaz Favaro.

Na edição da semana passada, ele conseguiu ver bem além da maioria de seus colegas jornalistas. Percebeu que Zelaya pretendia dar um golpe na constituição para se manter no poder utilizando o método chavista de plebiscito. Narrou com razoável acerto os acontecimentos. O problema foi que não teve coragem de ir até o fim e discordar da chamada “comunidade internacional”.  Escreveu Favaro:

Como a Constituição não permite o impeachment, a oposição optou pelo caminho, digamos, tradicional. No dia previsto para o referendo, os militares o tiraram do poder com o apoio do Legislativo, da Suprema Corte e da maioria dos hondurenhos.

A oposição não tem nada a ver com a deposição de Zelaya e os militares não o tiraram do poder com apoio do legislativo e da Suprema Corte; os militares cumpriram um determinação judicial, o que é bem diferente. Não há nada de tradicional no que foi feito em Honduras se o jornalista está se referindo aos golpes de estado que assolaram a América Latina no último século. O presidente foi afastado do cargo em restrita obediência ao que está nas leis de Honduras.

Na edição de hoje, Favaro volta ao assunto e desta vez enfia o pé na jaca com vontade. “O golpe em Honduras é um inédito golpe de estado bem-sucedido nas últimas duas décadas.” Uma pena que o jornalista não tenha tido a coragem para encarar as consequências do próprio diagnóstico correto que tinha feito na semana passada.

Favaro resolveu se perder de vez quando afirmou:

O hondurenho Zelaya aliou-se ao presidente venezuelano e pretendeu aplicar a metodologia chavista em um ambiente pouco apropriado. Ele tentou mudar a Constituição e prolongar o próprio mandato mesmo sem ter apoio popular para tal aventura.

Quer dizer que se tivesse apoio popular, tudo bem? O problema de Zelaya não foi aplicar a metodologia chavista, mas o fazer em ambiente pouco apropriado. O que o jornalista quer dizer? Que Zelaya foi apressado? Que não soube solapar suficientemente a democracia para lhe dar o golpe mortal? É justamente o que está em jogo em Honduras, o princípio que nem o próprio povo pode fraudar a constituição e atentar contra os princípios democráticos. Na visão de Favaro, Cuba é a única ditadura do continente (o que já é um avanço em relação a média do jornalismo). Considera que a Venezuela vive um regime democrático, assim como seus satélites, Bolívia e Equador.

Continuando sua descida ao abismo (by Eric Voegelin), Favaro continua: “Deve-se sempre procurar uma saída institucional, mesmo que o presidente conspire contra a democracia” . O que pode ser mais institucional do que o que foi feito em Honduras? O legislativo vetou por esmagadora maioria a lei que Zelaya pretendia, a Suprema Corte declarou-a inconstitucional e apenas diante da insistência do presidente chamou o Exército, dentro do que prevê a carta, para depor o presidente. O comandante das Forças Armadas ainda tentou negociar com Zelaya para que este terminasse o mandato, acabou demitido. O que poderia ser feito diferente? Isso, o jornalista não aponta.

No final, Favaro ainda tenta se emendar e consegue perceber, pelo menos, que urna não é sinal de democracia e visualiza que a convocação de plebiscitos para reeleição atenta contra os princípios democrático. Já é bem mais do que a maioria do seus colegas consegue enxergar.

E Hillary Clinton. E Obama.

Falta ao jornalista a coragem de seguir o rumo certo de seu pensamento, mesmo que contraria a idéia pré-concebida que tem do mundo, aquela que lhe foi imposta pela doxa do momento.

Um pensamento sobre “Cobertura da Veja sobre Honduras

  1. Parece que só restou mesmo a internet para uma cobertura correta dos acontecimentos. O pior é que ela parece pouco suficiente para fazer frente à cobertura tristemente vermelha da imprensa brasileira e internacional.

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