A Importância da Tradição

O mundo contemporâneo tem por uma das suas principais características o rompimento com o passado, a crença que o novo é sempre melhor do que o velho. Não é difícil de constatar. Quantas propagandas de televisão se referem a um “novo” produto, mesmo que seja para lá de antigo. Na própria política se ouve falar o tempo todo de novo. Barack Obama se coloca nas eleições americanas como um novo político. A esquerda mundial se define como a nova esquerda. Hugo Chávez quer estabelecer o novo socialismo.

Este tema não é novo, Ortega y Gasset tratou dele nas décadas de 20 e 30 quando definiu o que seria o homem-massa. Uma das suas características, segundo o autor, é o rompimento com o passado. Este homem está convencido que o mundo de possibilidades cada vez mais infinitas que encontra a sua volta é obra do acaso. Não reconhece o esforço de gerações para que se chegasse ao nível tecnológico, econômico, político atual. Por isso despreza o passado e se atém apenas no presente.

Gasset argumenta que o que diferencia o homem do animal não é a inteligência, mas a capacidade de reter memória. Existem animais que se mostram bastante inteligentes, mas por não conseguir guardar informações não conseguem aprender e evoluir. A humanidade tem uma bagagem cultural que se configura na tradição; é perigoso desprezá-la. “O verdadeiro tesouro do homem é o tesouro de seus erros, a longa experiência de vida decantada gota a gora durante milênios (…) Romper a continuidade com o passado, querer começar de novo, é aspirar a descer e plagiar o orangotango“.

Isto não quer dizer que tenhamos que estar presos a esquemas que não funcionam. A questão é saber o que não está funcionando. Muitas teorias modernas de liderança trazem estórias que mostram a tradição como algo que caducou, o líder está sempre modificando-a. Se não se sabe porque uma coisa é feita de uma determinada maneira, é porque não precisa ser feita assim.

É neste ponto meu maior questionamento. Acho que para mudar algo, deve-se estudar a fundo este algo e estar convencido que não funciona ou que pode melhorar. Na dúvida, deve ser mantido. Por que tanta pressa com a mudança? Por que não fazê-la de forma segura e consciente? Por que o desprezo automático com nossos antepassados?

A educação é um grande exemplo do perigo da mudança sem reflexão adequada. É lógico que não se deve desprezar as novas tecnologias e as novas variáveis do mundo moderno; mas daí a jogar no lixo tudo que a tradição nos mostra nesta área vai uma distância muito grande. No Brasil existe um ímpeto de mudar nossos processos educacionais pelo ouvi dizer. Nossos condutores do processo ouvem falar de determinado autor, de determinado método revolucionário e pronto, mudança radical. O resultado está aí para quem quiser ver, o quase total fracasso do sistema educacional brasileiro.

A educação é só um exemplo. Nunca a mudança foi tão desejada por todos, nunca foi tão presente em nossas vidas. O mundo está melhor por causa disso? As pessoas estão melhores por causa disso? Onde está nos levando o desprezo pelo antigo?

Respeito muito a tradição, sempre procuro escutar os mais velhos. Acredito que eles possuem respostas para problemas atuais, mesmo que formulados em bases diferentes. Olavo de Carvalho defende que o mundo ocidental foi assentado na filosofia grega, no direito romano e na tradição judaico-cristã. Quando estas bases são solapadas, a própria civilização se perde.

Por isso desconfio do novo por ser novo. Não basta. É dar um cheque em branco para um futuro incerto. A mudança começa com o respeito ao passado, o seu entendimento. Somos o que somos por nossa tradição, temos que entendê-la; a partir daí estaremos aptos para pensar em modificá-la e com muito cuidado.

6 pensamentos sobre “A Importância da Tradição

  1. Ao progresso do conhecimento corresponde o progresso da ignorância: o erro também evolui. Assim, desprezar a tradição significa abrir-se ao erro até então evoluído: não só o assassinato pode se tornar aceitável, como as formas mais brutais e sofisticadas de assassinato, suas apologias e ideais, estarão todas disponíveis e desenfreadas.

  2. Sim… Também concordo que estudar, conhecer e compreender o nosso passado é extremamente importante. Mas não temos de continuar a viver como o “Homem das Cavernas”…

  3. Conservar o que existe de bom na tradição não é a mesma coisa que manter tudo como está. O problema da modernidade é que se convenceu que tudo deve ser mudado, que um mundo novo deve ser construído, esquecendo da lição do Eclesiastes: não há nada de novo sob o sol.

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