Um trecho de Zizek

Ainda não li o tal Zizek. Com tanta coisa boa ainda na lista, tenho que fazer uma enorme força para colocar autores, digamos, polêmicos nessa fila. Afinal, se nem terminei de ler tudo de Platão, como colocar qualquer outro?

O fato é que peguei para folhear um livro dele, na verdade uma entrevista. Um trecho que li foi um que ele fala do Livro de Jó. Diz Zizek que fontes na Igreja Católica (sempre desconfio quando alguém usa esse termo, “fontes”) disseram a ele que se fosse possível revisar a Bíblia, seria um livro que tirariam. Eu poderia observar que foi a própria Igreja que colocou-o ali, em primeiro lugar, mas talvez eu não o tenha entendido. Para ele, o Livro de Jó seria quase anti-católico pois evidenciava o fracasso de Deus.

Por coincidência eu tinha acabado de ler mais uma vez esse livro, que na minha opinião é um dos principais do Antigo Testamento, e confesso que não entendi onde ele quis chegar. Anti-católico? Como? Será que ele não percebeu que Jó representa o homem comum, que tem dúvidas sobre a justiça divina quando algo acontece de errado com ele? Que os sábios representam os tentadores que tentam colocar em sua mente que se algo de ruim aconteceu é porque ele fez algo muito grave? Que Iahweh aparece para dar uma esculhambada em todo mundo e colocar Jó e sábios em seus devidos lugares, embora demonstre toda simpatia por Jó por reconhecer nele a dúvida autêntica? E que o recompensa em dobro por Jó ter aceitado a providência divina e parado de tentar entender o que está além de sua compreensão? Que existe um mistério divino que ao homem é impenetrável, ou  seja, que nosso conhecimento é limitado? Que a justiça de Deus só faz sentido quando englobamos também o plano da transcendência?

O livro é tão rico que se pode observar Zizek em vários momentos. Como os sábios que tentam provar Deus por uma lógica eminentemente humana, o da justiça do aqui se faz e aqui se paga. Como satanás quer tirar do homem para mostrar que ele não é tem tanta fé assim. Como o Leviathan quer usurpar o poder que não é seu.

Gostaria de ver a cena que Iahweh apareceria para Zizek e exclamaria: “Cinge teus rins!” , ou em português de hoje, “coloque-se no seu lugar!”.