MP da pilantropia volta para o Planalto

Globo

Num inusitado desafio ao presidente Lula, o presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), cumpriu ontem sua ameaça de devolver ao Palácio do Planalto, sem votação, a medida provisória número 446, que renovou o certificado de entidades filantrópicas suspeitas de irregularidades. Esta é a segunda vez na História que o Senado toma uma atitude como esta. Garibaldi alegou que a MP é inconstitucional, e se queixou do abuso na edição de MPs. A decisão, aplaudida pela oposição, provocou reação indignada do governo e de líderes governistas.

Comento:

Lembro que quando li a constituição de 88 pela primeira vez, achei que o poder executivo ficava submisso ao legislativo. Ilusão. Na prática aconteceu justamente o contrário. A existência ainda da medida provisória subordinou o Congresso Nacional aos desejos do chefe do executivo, o que não é bom.

Quando eclodiu a crise financeira nos Estados Unidos, chamou-me atenção o fato do presidente americano ter que submeter o pacote que praparou à aprovação do Congresso. Pela legislação brasileira seria sim um caso de MP, pois tratava-se de urgência e relevância. Será que realmente precisamos das MPs para um governo funcionar? Ah, mas leva muito tempo para aprovar uma lei no Congresso. Mas até que ponto as MPs atrapalham o andamento dos trabalhos? Até que ponto o Congresso está legislando sobre temas irrelevantes para a federação, que ficariam bem melhor na legislação estadual?

As MPs são instrumentos de autoritarismo e cada vez me convenço mais que devem ser limitadas drasticamente ou mesmo extintas. Para o bem da democracia.

Prevaleceu o bom senso

Folha:

O presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Carlos Ayres Britto, defendeu ontem o uso “desembaraçado” da internet para fins de propaganda política nas eleições de 2010, mas afirma que será necessário mudar a legislação eleitoral, “seja pela via legislativa, seja pela declaração de inconstitucionalidade das restrições”. A decisão do TSE da última sexta-feira liberou o uso dos sites de jornais e revistas, mas manteve a proibição para televisões, rádios e portais em geral.

Comento:

Foi uma decisão acertada. Censura na internet é um absurdo total, ainda mais levando-se em conta que a maior parte do conteúdo da rede é produzido por indivíduos. Quando se derruba uma comunidade no orkut em apoio a determinado candidato, na prática atua-se contra a liberdade de expressão.

Ainda existe muito a avançar. Esta estória de patrulhar as redes convencionais porque se tratam de concessão pública é de amargar. os negócios, lucros e prejuízos, são arcados por empresas particulares. Cabe apenas a elas decidir sua programação e deve-se confiar um pouco mais na capacidade das pessoas de decidir o que desejam e o que não desejam assistir.

Políticos não gostam muito de liberdade de imprensa, sabem que em geral receberão críticas. É assim que deve ser. Políticos devem ser constantemente vigiados; a imprensa é parte da vigilância saudável sobre as coisas públicas.

A imprensa livre é uma das garantias para a democracia.

Refletindo sobre a democracia

Quando o Congresso Nacional impediu que o presidente Collor concluísse seu mandato diante da evidência de corrupção em seu governo, a democracia brasileira saiu fortalecida. Havíamos concluído um processo contra o presidente da república sem que o país entrasse em uma crise institucional e sem ameaças de golpe.

Em 2005 o Brasil conheceu a essência do governo Lula. Compra de votos de parlamentares com dinheiro público era apenas a face mais vistosa. Tinha de tudo, corrupção, uso do estado para atender ao partido, farra entre ministros e empresários, abuso de poder. Nunca tantas evidências de corrupção de um governo surgira em tão curto espaço de tempo.

Naquele momento a democracia brasileira teve um senhor teste. Poderia um presidente ser deposto legalmente por crime de irresponsabilidade sem o apoio expressivo da sociedade? Lula tinha índices de popularidades bem abaixo do atual, mas mesmo assim bem acima de Collor em 1992. Poderia ter recebido o impeachment?

Falhamos miseravelmente no teste. A oposição foi incapaz de formular o pedido, a questão não chegou nem ao plenário do Congresso. Na democracia brasileira, as leis não eram soberanas. Criou-se a tese que um presidente poderia fraudar as leis, desde que não perdesse o apoio popular. Isso não é democracia.

Em 1972 Nixon foi re-eleito presidente dos Estados Unidos com uma votação arrasadora. McGovern, o queridinho da mídia liberal, conseguiu míseros 17 votos no Colégio Eleitoral. Não conseguiu vencer nem nos liberais estados da Califórnia e Nova Iorque.

Dois anos depois renunciou durante um processo de impeachment. Nixon ainda era um presidente popular e não havia evidências que perderia o mandato. Hoje a historigrafica americana começa a colocá-lo sob uma nova perspectiva; talvez tenha agido com um estadista ao optar por não levar seu país a uma divisão quando o inimigo soviético ainda era ameaçador.

O próprio presidente Clinton, também popular, enfrentou um processo. Ao contrário de Nixon foi até o final e conseguiu concluir seu mandato. O país ficou literalmente dividido e essa foi a herança que Bush recebeu. Além de um ataque devastador de terroristas islâmicos.

Nos dois exemplos americanos a democracia foi testada e aprovada. Pode-se discordar de uma ou de outra atitude dos presidentes; não do processo legal. Em qualquer um dos casos o presidente, a despeito de sua popularidade, não se colocou acima das leis.

No Brasil percebe-se hoje que Collor só perdeu seu mandato pela trapalhada de sua equipe econômica que falhou miseravelmente no cobate à inflação. A economia tem um peso enorme sobre a popularidade de um presidente e Collor pagou o preço. Tivesse popularidade, teria concluído seu governo.

No caso de Lula a democracia brasileira mostrou sua imensa fragilidade. Diante das evidências gigantescas de corrupção o presidente valeu-se dos índices de popularidade, e depois dos votos, para manter-se no poder. As leis foram solapadas.

Tudo isso é muito ruim porque vai consolidando no pensamento das pessoas que a democracia não é um bom modelo, o que abre a porta para os monstros morais. A falha dos políticos em defender os princípios legais em 2005 ainda pode resultar em males ainda maiores do que deixar a nação ser saqueada por um partido bandido. Podemos acabar ainda menos democráticos, em um regime próximo de gente com Hugo Chávez, uma semi-ditadura com roupagem democrática.

Estado gigante

Estou sempre batendo aqui na tecla do gigantismo do estado brasileiro que parece só saber crescer. Vejam o que diz a Folha de São Paulo hoje:

Nos 20 anos que se seguiram à Constituição, a economia mundial dobrou de tamanho, mas o Brasil esteve longe de acompanhar o ritmo: o aumento da renda nacional não passou dos 60% e, mantido o desempenho médio do período, levará mais uma década para completar os 100%. Nos 20 anos anteriores ao texto constitucional, a economia do país teve expansão de 260%.

Em contraste, o Estado brasileiro, em receitas e despesas de todos os níveis da administração pública, cresceu a velocidade poucas vezes observada em países democráticos em tempos de paz. Tornou-se, praticamente sem concorrência, o maior do mundo emergente.

Com a carga tributária na casa dos 36% do PIB (Produto Interno Bruto), o Brasil ostenta hoje um gasto público que, como proporção de sua economia, se compara à Europa de tradição social-democrata -ainda que, por falta de PIB, a qualidade dos serviços esteja longe dos padrões do Bem-Estar Social europeu.

Nas outras principais economias latino-americanas, México, Chile e Argentina, a arrecadação varia de um quinto a um quarto da renda nacional. Nas duas maiores economias do mundo, EUA e Japão, o percentual não se afasta muito dos 25%. Esse patamar era mantido no Brasil desde o final da década de 60, até a disparada da carga após a redemocratização.

Esse é o resultado da nossa constituição cidadã, a que tentou implantar o bem estar social no país a força. A que quis distribuir renda que não existia. A que considera o estado como o ente mior de uma nação e única forma de resolver seus problemas.

Feliz aniversário.

Fala Tarso Genro (e o que não falou)

Nós vemos o Poder Legislativo impotente para tomar grandes decisões infraconstitucionais que tenham força normativa para fazer a Constituição de 1988 avançar em seu sentido programático e, de outra parte, vemos o Poder Judiciário avançando num terreno aberto por essa omissão do Poder Legislativo e tomando determinadas decisões que geram um certo desequilíbrio entre os Poderes

O que Tarso Genro não falou foi que o Poder Legislativo está impotente para tomar decisões porque o Poder Executivo tomou suas prerrogativas e é quem de fato legisla no país através das medidas provisórias, cujo governo que pertence é recordista.

Quando tenta colocar o Judiciário como vilão do desequilíbrio, Tarso busca esconder que é o Poder Executivo que precisa ser podado. Vejam o que está acontecendo nos Estados Unidos, o governo Bush preparou um pacote econômico para socorrer o mercado financeiro e o Congresso rejeitou-o. Aqui no Brasil se cria uma estrovenga desnecessária como, por exemplo, a TV Lula, que é aprovada sem a participação do Legislativo. Por isso lá existe uma democracia e aqui este arremedo disforme.

Continua a demonização do voto

Nosso sistema eleitoral está longe de ser razoável; o voto obrigatório, a eleição proporcional, o horário eleitoral obrigatório na TV, a quantidade gigantesca de candidatos, as regras ditatoriais da justiça eleitoral, tudo isso contribui para que o processo democrático no Brasil não funcione como deveria.

Como sair desta armadilha? Como romper este círculo? Ontem um amigo disse que era completamente cético, que nunca nos livraríamos da nossa elite política, de nossas oligarquias. Talvez tenha razão, realmente é um problema cuja solução não se mostra evidente.

Intuitivamente a educação surge como uma resposta. Um povo mais educado, em teoria, teria mais condições de julgar melhor a realidade. Quando vejo a posição dos intelectuais brasileiros começo a duvidar. Que um jovem universitário se empolgue com as idéias socialista é até compreensível, vive em um mundo de sonhos, não tem ainda a vivência da realidade para compreender que estamos em um mundo real onde essas idéias simplesmente não funcionam. O grande problema é ver a quantidade de intelectuais já com certa idade defendendo o retorno ao tempo do boi e do arado.

Mais educação? Com certeza, mas educação e não doutrinação ideológica. Ensine o homem a lógica, a matemática, as regras gramaticais, a física, a química, a história, a geografia e ele compreenderá melhor o mundo. Eleja como prioridade formar o cidadão e você terá o homem massa tão bem descrito por Gasset, a vaquinha de presépio das idéias que atrasam, quando não destroem, a sociedade.

Se achar o caminho para reformar nosso sistema viciado e fracassado é difícil, saber o que não funciona é muito mais fácil. Alertei há uma semana, e o quadro não mudou, que existia uma campanha sistemática de demonização do voto. A principal evidência é o trabalho dos chargistas. Por que os chargistas? A charge na capa de um jornal é a primeira coisa, talvez a única, que um analfabeto funcional se ocupa. Seu poder no consciente e subconsciente é ainda subestimado por muitos.

O que poderá vir de bom em convencer o eleitor que seu voto é inútil, que todos os políticos são desonestos? Combinado com o voto obrigatório só teremos a continuação da degeneração política brasileira e a perpetuação do divórcio entre a sociedade e a classe política. A demonização do voto não é uma saída, os chargistas deveriam estar alertando aos eleitores a importância do voto que está depositando na urna, é possível fazer bastante humor crítico com esta premissa.

Como disse antes, a constância e quantidade de charges sobre o assunto me preocupa. Não teria uma mão invisível por trás destes artistas? Não teria o movimento sido orquestrado?

O que pretende eu não sei, mas sei o suficiente para saber que não será bom para a democracia; não será bom para a sociedade.

Se a eleição brasileira fosse como a americana…

Fiz um exercício de pura curiosidade. Apliquei ao Brasil o modelo eleitoral americano no resultado das eleições 2006 em primeiro turno. Por que em primeiro? Porque não haveria a necessidade do segundo já que o vencedor conseguiria a maioria do colégio eleitoral. A petralhada pode ficar tranqüila, Lula ainda seria eleito com 268 cadeira contra 245 de Alckmin.

Sobre democracias

Os Estados Unidos possuem uma crise sem prescedentes para resolver, é necessária uma atuação enérgica. O governo prepara um plano de ação e… envia ao Congresso! Para nós, da Banânia, é algo de incompreensível. Não é relevante? Não é urgente? Por que ele não redige uma medida provisória?

Por que lá é uma democracia. Um plano desta magnitude e importância merece toda a urgência mas não pode atrapalhar a harmonia entre os poderes. Cabe aos representantes eleitos pelo povo americano a decisão de usar ou não o plano proposto pelo governo; mais, cabe ao parlamento modificá-lo. Assim deve funcionar em um sistema democrático.

A aberração é o que acontece aqui onde existe uma excrescência chamada Medida Provisória. Seus defensores argumentam que se não fosse assim nada seria feito pois o Congresso leva séculos para aprovar um lei. Pode até levar, mas é preciso obsevar que o principal fator de lentidão do Legislativo é justamente o acúmulo de medidas provisórias na pauta. É uma situação ilógica. Como existem muitas medidas provisórias o Congresso não vota e porque não vota é preciso usar medidas provisórias.

Mas se as medidas provisórias virassem projetos de lei não ficaria tudo na mesma? Aí vem outro problema da nossa democracia, o governo quer legislar sobre tudo. Como não existe federalismo de fato, temos tudo em cima das instâncias federais. Um país das dimensões do Brasil não pode ser governado inteiramente por Brasília; talvez esteja aí o começo dos nossos males.

É fácil perceber que na maioria dos municípios brasileiros as Câmaras de Vereadores ficam às moscas. O município tem muito pouca autonomia e os estados passam o tempo discutindos matérias irrelevantes. O resultado é o acúmulo no Congresso Federal que realmente não tem como dar conta de tanta demanda.

Nossa constituição é gigantesca e toda emendada. Os códigos são inúmeros, cada um maior do que o outro. Não há poderes que dêem conta do próprio monstro que criaram. Por isso temos leis sobre tudo que se puder imaginar: tamanho de fila em banco, proibição de uso de saleiro, etc. O salário mínimo deve ser fixado por lei anualmente! São leis demais e o resultado é esta burocracia ineficiente e um estado gastador e perdulário.

Bush está negociando com o Congresso a aprovação do pacote. É assim que se faz. Aqui o presidente pega a caneta e a patuléia aplaude.

Jobim defende tirar o sofá da sala

Lembram da piada do homem que pega a mulher com outro no sofá da sala? Para resolver o problema ele retira o sofá, mais ou menos o que Jobim defendeu ontem. A PF vazou informações para a imprensa, o que é crime. No entanto o ministro defende que a imprensa seja impedida de publicar o que recebeu. Sempre que se ataca a liberdade de imprensa a democracia sai perdendo, cuidado Ministro!

Globo:

BRASÍLIA. Em depoimento à CPI do Grampo, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, defendeu mudanças na legislação para punir pessoas responsáveis por vazar informações obtidas em escutas telefônicas, inclusive jornalistas. Jobim também sugeriu que a imprensa possa ser obrigada a revelar suas fontes em alguns casos.

– Os senhores terão que prestar atenção não só no interceptador ilícito, mas também no vazador de informações. Se os senhores não fecharem as duas pontas, vai continuar a acontecer o que está acontecendo – disse Nelson Jobim.