Memória: seção da tarde

Ontem estava elaborando uma lista de 10 filmes essenciais de comédia e não pude deixar de lembrar da seção da tarde. Os mais novos não sabem disso, mas existiu um período pré-histórico onde não havia streaming e não tínhamos acesso aos filmes que desejávamos. Nossas únicas fontes eram o cinema e a televisão.

Naquele tempo, como diziam os antigos, era comum vermos filmes durante a tarde, período em que não costumávamos ter aula, e nem todas estas atividades que colocamos para nossas crianças todos os dias para “ocupar” o tempo delas. Volta e meia, num dia de languidez, nos deparávamos com a seção da tarde, na Globo, antes de ser tornar essa porcaria que temos hoje. Como o propósito era passar filmes mais leves, próprios do horário, era comum o uso de comédias, quase todas americanas.

Engraçado como a memória funciona. Lembro de um seminário que participei em que uma neuro-cientista falou da propriedade da memória, que os sentimentos tem um forte papel em gravar uma imagem em nosso cérebro. Outro dia, num curso de escutatória, o mestre falou sobre fatores que ajudam a guardar algo na memória, especialmente associar o que queremos lembrar ao sentimento, imagens e repetição. Tudo muito moderno, não é?

Pois hoje lendo a Suma Teológia, do Santo Tomás de Aquino, deparei-me com uma passagem justamente sobre a memória. Ele considerava a memória como parte da prudência, uma das quatro virtudes cardeais. Na questão 49 (volume 3) ele aponta quatro formas de reforçar a memória:

  1. associar a lembrança com algo semelhante, como imagens, que já tenhamos presentes em nossa memória
  2. guardar ordenadamente o novo conhecimento, integrando-o a outros conhecimentos existentes
  3. associar afeto ao que desejamos lembrar
  4. meditar constantemente sobre o que queremos guardar

Ou seja, em pleno século XIII, São Tomás já trazia o que seria confirmado pela neuro-ciência no século XX-XXI.

Concluo com uma das passagens que marquei:

a memória do passado é necessária para aconselhar com acerto sobre o futuro

O problema da atenção

Ainda sobre o curso de escutatória, Thomas Brieu fala muito sobre a necessidade de atenção no ato de escutar. Isso acontece porque escutar é mais exigente que imaginamos. Temos que escutar o que o outro está falando, captar sua postura, pensar no que ele quer dizer, captar as palavras, pensar sobre elas, compreender o que está sendo dito, colocar na memória. É muita coisa e por isso temos que ter bastante atenção.

Pensando a partir deste ponto, fico refletindo que é justamente a atenção um dos principais problemas do momento. Este mundo crescentemente digital, com excesso de informações, parece só contribuir para nossa perda da capacidade de atenção. Queremos fazer tudo ao mesmo tempo e sem pensar no que estamos fazendo. Ou seja, não temos a devida atenção com nada.

Pelo que Brieu nos fala, sem atenção, não escutamos direito. E se não escutamos, a porta está aberta para o conflito. Não é surpresa, portanto, o ambiente belicoso que estamos vivendo, dentro de nossas próprias famílias.

O ponto positivo é que depende de nós diminuir esta fervura. Basta escutar com atenção. A pergunta que fica é: estamos dispostos?

O poder da escuta

Nas últimas semanas assisti um curso sobre escutatória. Foi uma experiência bem interessante e uma oportunidade de refletir sobre um tema que talvez mereça muito mais destaque do que imaginava. Até que ponto estamos realmente escutando o outro? E não escutando, que consequências temos no diálogo e até na possibilidade de se buscar entendimentos necessários? O curso teve como foco o ambiente de trabalho, mas creio que traz importantes reflexões para nosso dia a dia.

Quando olhamos para o ambiente tóxico de muitas redes sociais, especialmente as que se prestam mais a discussões públicas, não posso deixar de me perguntar até que ponto não é nossa incapacidade de escutar de verdade que geram muitos desentendidos e conflitos, muitas vezes no seio de nossa própria família. Ouvimos, mas não escutamos. Lembra algo que um antigo mestre falou diversas vezes: ouçam os que tem ouvidos para ouvido. Ter ouvido não significa realmente que estamos escutando.

Recentemente participei de uma reunião que o personagem central demonstrou não estar ouvindo, o que gerou muito desentendimento. Faltou-lhe abilidade para escutar mais e falar menos, o que teria resolvido a crise que se instalou de maneira muito mais proveitosa e simples, evitando todo um desgaste desnecessário. Será que a sabedoria não está em escutar mais e falar menos? Afinal, como ponderar e nos aconselhar se não temos material para trabalhar? Se não escutamos de verdade o argumento do outro?

A sabedoria popular já nos alerta que temos uma só boca e dois ouvidos…

Dia dos pais

De todos os papéis que exerço nesta vida, talvez nenhum seja tão importante do que ser pai. É uma baita responsabilidade, uma dedicação sem fim e, sobretudo, um ponto central em tudo que fazemos a partir do momento que temos a oportunidade, um verdadeiro presende de Deus, nosso Pai maior, de ter uma pequena criaturinha em nosso braço. Engano. Começa antes, bem antes. No momento que nos abrimos para esta possibilidade e temos a confirmação que nosso filho está a caminho. Afinal, ele já existe desde o momento da concepção (por isso mesmo a data da encarnação não é 25 de dezembro como muitos pensam, mas 25 de março. Neste dia o Senhor já estava entre nós).

Infelizmente há aqueles que pensa num filho como um custo e uma obrigação, uma espécie de âncora que impede a liberdade. Só em na cultura doente, para não dizer moribunda, que vivemos para uma visão destas ter alguma relevância. Meus filhos nunca significaram isso para mim. Sempre foram expressão da minha liberdade e fonte de luz para minha própri vida. O meu norte passa por eles, sempre.

E, claro, dia dos pais é dia de agradecer. Ao meu pai, que tenho o privilégio do conviver há quase 50 anos. E também ao nosso Pai maior, que está nos céus. Há eles devo o dom da vida e os bons conselhos que me ajudaram a direcionar minha vida todos estes anos. Ser pai é algo poderoso, embora há os que tentem diminuir esta importância, geralmente por questões ideológicas. É estarrecedor ver tantas crianças crescendo sem pais, fruto desta liberdade sexual desenfreada que nada mais é que uma desculpa para o hedonismo e destruição da família. Precisamos resgatar o papel do pai dentro da família e o papel da família dentro da sociedade. Somos a verdadeira resistência!

Parabéns a todos os pais deste mundo! Não é fácil nossa tarefa, mas é, acima de tudo, um presente dos céus.

P J Wodehouse

Estou lendo um livro de contos de P J Wodehouse, chamado Carry On, Jeeves. Entretenimento de primeira. Coisa fina.

Jeeves é o valete de um jovem nobre, Bertie, protagonista das estórias, mas é Jeeves que conduz a solução dos diversos problemas. Ele domina a arte de comandar sendo comandado. Coisa para poucos.

Wodehouse é irônico, satírico, bem na tradição dos grandes escritores ingleses. Não foram poucas as vezes que me vi rindo sozinho. Fazia tempo que não me divertia tanto com um livro.

Retomando, again.

Entre idas e vindas, retomo este espaço.

Nas últimas semanas as coisas andaram agitadas. Mudei-me com a família para uma casa, o que ainda nos exige um bom tempo de arrumação; tempo este, inclusive, que nem tenho, pois o trabalho tem me exigindo muito, especialmente em viagens. Nos últimos 2 anos e meio o que colecionei de milhas aéreas é uma grandeza. Acho que voei mais neste período que toda minha vida somada. Reclamo? Não. O job mais do que compensa, embora sinta falta de ficar mais tempo em meu lar. Ainda mais com casa nova!

Não foi só isso. Também usei este tempo para refletir mais e opinar menos. De vez em quando passo por este ciclo. Já dizia a antiga sabedoria: há tempo para tudo nesta vida. Há tempo de recolhimento, crescimento interno e há tempo para expansão, para dividir o que achamos bom. Estou entrando novamente nesta segunda fase do ciclo.

Atualmente estou lendo o livro dos provérbios. Segue um que tem a ver com o que disse acima:

O caminho do estulto é reto aos seus próprios olhos, mas o sábio escuta o conselho.

Pv 12, 15

Como estou aprendendo com São Tomás, na Summa, conselho não necessariamente vem de fora, de outra pessoa, mas do uso da nossa razão. Nós frequentemente nos aconselhamos; é uma das partes da razão. Só que para isso, temos que refletir, entender o nosso contexto e deliberar sobre o que é melhor, sempre visando os bens verdadeiros. Por isso precisamos de tempo, de parar um pouco esta roda viva da modernidade, desacelerar. Quando nos tornamos escravos deste ritmo louco da modernidade, perdemos a capacidade do conselho e passamos a agir sem o uso de nossa razão, que no fundo é um processo de desumanização.

O processo de nos tornarmos “integralmente humanos” passa pelo tempo que separamos para refletir sobre nossas vidas. Ou seja, precisamos recuperar nosso controle sobre o uso do tempo. É difícil? Se, é! Mas não temos outra escolha. Se não o fizermos, veremos a nossa vida passar em um instante e, no fim, nos restará o arrependimento de ter vivido muitas experiências e não termos aproveitado nenhuma.

De mudança

Dias agitados, correria, estamos novamente nos mudando. Depois de mais de 3 anos no mesmo apartamento (meu recorde pessoal), decidimos nos aventurar e aceitar uma oportunidade que nos surgiu de ir morar numa casa.

Creio que os últimos dois anos foram decisivos para esta decisão. Talvez nem pensássemos se fosse no fim de 2019, mas a pandemia nos fez repensar muitas coisas em nossas vidas e valores como espaço e natureza foram muito valorizados.

Hoje sai o caminhão e amanhã estamos nos instalando. O dia que puder sentar calmamente em minha varanda para contemplar o por do sol vou me considerar oficialmente em meu novo lar.

Até lá, as confusões e caos que uma mudança nos traz.

Reflexões soltas

1

O covid não desapareceu e nem acho que vá desparecer tão cedo. Vamos ter que aprender a conviver com ele, o que é bem diferente desta bobagem de “novo normal”. Não tem nada de novo em aprender a viver com um virus ou doença que veio para ficar. Já fizemos isso milhões de vezes, só não tinha rede social para acompanhar e nem uma mídia histérica para defender abertamente a abdicação da vida.

2

Fico pensando o que seria se houvessem redes sociais na época que a AIDS surgiu. Teria sido a mesma coisa? Duvido.

3

Descobri esta semana que não é obrigado testar covid para entrar no Brasil. Mas tem um detalhe, só para os vacinados. Os demais tem que testar. Como já sabemos que a vacina não impede o contágio é como se os burocratas dessem licença de transmissão de covid apenas para os vacinados. E ainda chamam isso de ciência.

4

O Brasil está flertando perigosamente em colocar na presidência um criminoso condenado que teve suas condenações anuladas porque o bandeirinha esqueceu de ligar a máquina de lavar quando saiu de casa para trabalhar num jogo. É o sonho de voltar tudo como era antes, aquela grande harmonia para assaltar o país. É muita ilusão dos demônios que estão executando este plano digno de Pink e Cérebro. Vai explodir na cara deles, mas não sem sofrimento para todos nós.

5

A vida é feita de muitos pequenos momentos. Não podemos fazer pouco caso deles na convicção que vão acontecer sempre que quisermos. Pode ser nossa última oportunidade de viver um deles. Ninguém controla o próprio destino. Esta é mais uma ilusão da modernidade. Ninguém controla seu futuro.

6

Falando em ilusões modernas, toda vez que alguém te falar que nós somos o centro de nossa existência, faça imediatamente um sinal da cruz se for católico. E saia correndo. Não há como argumentar com o demônio, só fugir.

7

As pessoas quando querem ser espiritualizadas recorrem a mil meditações orientais. Pois existe uma ocidental que traz todos os benefícios espirituais e mais uns bônus. Chama-se terço. E foi nos dada por Nossa Senhora. Oração e jejum são ferramentas poderosíssimas para nos ensinar nosso lugar no universo.

8

José Monir estava certo. A educação só pode acontecer em nosso sistema formal por acidente. Tudo é feito para que ela não ocorra, mas sempre há gente teimosa o suficiente para aprender, apesar de tudo.

9

Quer aprender? Estude com quem sabe. Mesmo que o mestre esteja morto há muitos séculos. Pelo menos já sabemos que passou pelo teste do tempo. Mesmo Karl Marx? Mesmo o velho Karl. Só temos que aprender a valorar o que cada um está dizendo. Aprendemos mesmo com os erros dos outros, mas temos que saber que trata-se de um erro. Há algo de demoníaco em confundir pecado com virtude.

10

Estou no meio da vida, ou pelo menos imagino. Cada vez valorizo mais o que tenho e deixo de ser sonhador. As conquistas materiais que precisava, foram feitas, mesmo que sempre queira mais. A maior conquista está sempre aberta, até nosso último dia, o reino dos céus. Não há ninguém tão perfeito que não possa perdê-lo em uma decisão ruim. E ninguém tão perdido que não possa conquistá-la no último momento. Vigiai, nos disse o Cristo. Vigiemos, pois.

Modismos

Sábado de manhã, participando de um workshop que vai me tomar o fim de semana inteiro, o instrutor comenta:

__ Vamos fazer um combinado? Se em algum momento destes dois dias eu falar para vocês em mudança de mindset eu devolvo o dinheiro de todo mundo!