CDs: duração foi um estrago

Um problema que o CD criou para a indústria musical foi seu tamanho. De uma hora para outra se passou de um LP de 45 minutos para um CD de 70 minutos. Foi ruim para os artistas que trabalhavam o conceito de album, que pensavam a composição do disco inteiro; mas para os artistas de hits é que foi um verdadeiro desastre.

Sim, pois existe em geral dois tipos de artistas. Existem aquele que pensam em albuns e aqueles que pensam em hits. Os primeiros buscam um trabalho coeso, que tenha boas músicas em todo disco. Não quer dizer que não tenha hits, mas o restante mantém o nível do disco. Pensem no Revolver dos Beatles ou The Number of the Beast do Iron Maiden. Os dois possuem hits, mas o restante do disco é de mesmo nível.

Pois estes artistas de uma hora ao invés de compor 45 minutos de músicas tiveram que passar a compor 70 minutos. Ou seja, muita coisa que ficaria como extra, passaram a compor o disco. O resultado, em geral, era bem irregular. Era como se a banda tivesse que lançar todos os seus albuns como duplos, o que se fazia uma vez ou outra. O disco do Iron Maiden Fear of the Dark é um bom exemplo. Eu cortaria quase metade do disco e ele passaria de um trabalho bom para excelente. (Polêmica: acho o disco mais fraco da banda).

Mas se a duração do CD foi ruim para a banda que pensava o album, para os artistas que pensavam hits, foi um desastre. O que significa pensar hit? O artista se esforça mesmo é para fazer 2 ou 3 hits. O restante do disco é de fillers, ou seja, preenchimento. É canção bem meia boca apenas para ocupar o espaço. O que vai puxar as vendas é o hit. Se antes eles compunham umas 6 canções meia boca, agora tinham 10. Tem que ser muito fã para escutar um CD inteiro de um artista que só busca os hits. Um exemplo é o disco 1987 do Whitesnake, campeão de vendas. Ali tava na cara que Coverdale queria 2 ou 3 hits para conquistar o mercado e deu. Isso porque o disco ainda foi na época do LP. Com o CD veio coisa bem pior, com muito mais música para ocupar espaço. Adoro Whitesnake, mas como album sou muito mais um Come And Get It (1981), sem hits mas um album coeso.

Pensando bem, acho que vou formas umas listas no spotify de CDs limitados a 45 minutos, tentando imaginar como ficaria o album.

Exemplo: Fear of the Dark (Iron Maiden)

Lado A

1. Be Quick or Be Dead

2. From Here to Eternity

3. Afraid to Shoot Stranger

4. Wasting Love

Lado B

1. The Fugitive

2. Chains of Misery

3. Weekend Warrior

4. Fear of the Dark

Notas de Sexta: censura, Angel Dust, Borges e Pascal

Olá pessoal!
Eis minha lista semanal de 5 coisas interessantes que andei fazendo (inspirado pelo Tim Ferris 5-bullets friday)

Uma preocupação — A perseguição promovida pelos gigantes da tecnologia contra conservadores ou anti-esquerdistas. Não tem nada a ver com o conteúdo do que eles falam, e sim de quem são. Podem pesquisar. Um progressista pode falar o que quiser na rede e não será molestado, inclusive ameaçar de morte. O que está acontecendo é muito grave. Se a internet se tornar fechada para o pensamento contrário à cultura individualista da pós-modernidade, voltaremos a ser tutelados pela mídia tradicional.

Um Disco que passou batido — Angel Dust, do Faith No More. Durante os anos 90 eu cometi o grave erro de desprezar todo disco que veio depois de uma obra prima. Assim, abandonei o Metallica depois do black album, Megadeth depois do Countdown, Nirvana e outros. O mesmo aconteceu com Faith No More. Depois do grande album The Real Thing, criei muita expectativa com o seguinte e, para variar, me frustrei. Por acaso escutei o Angel Dust esta semana e gostei muito da primeira audição. Como fui idiota!

Um conto — Reli El Imortal, conto de Jorge Luis Borges onde ele explora a vida de um militar romano que adquiriu imortalidade ao beber de um rio no Egito. Depois ele passa a vida inteira procurando o rio que teria o efeito oposto e retomar sua mortalidade. Sensacional.

Um livro que terminei
A Mente Naufragada, do Mark Lilla. Interessante, mas creio que criei uma expectativa exagerada com o livro.

Citação que estou meditando

“A justiça sem a força é impotente; a força sem a justiça é tirânica”.
Pascal, Pensamento 103

E aí, o que acharam? Deixem uma opinião nos comentários. Gostaria muito de saber algo interessante que anda fazendo. Aproveite este espaço!

Justiça, política e realidade

Toda meditação sobre política deveria começar por uma meditação sobre justiça, já alertava Platão na República. É curioso que quase todo mundo pensa neste livro como um livro de política quando na verdade ele usa a meditação sobre a justiça como uma aplicação do método filosófico. O diálogo começa com um ancião, homem público de sucesso, pensando sobre a morte que se aproxima. Alguém diz a ele que o importante é ter vivido com justiça e ele se pergunta: mas o que é justiça?

Corte para os tempos atuais. Desde Maquiavel que aos poucos as sociedades foram se convencendo que a política independia de justiça. Seu propósito era pragmático; o importante era a coisa funcionar. Em cada eleição, as pessoas se perguntam se tal coisa vai funcionar ou não, mas pouco gente se pergunta se é justo. Sim, a esquerda usa o termo justiça social para tudo, mas é mais uma palavra de ordem para evocar sentimentos e justificar qualquer ação do que um conceito que tenha algo a ver com a realidade. Além do mais, sua visão é parcial. Ela vê alguém recebendo um benefício e chama isso de justiça, mas pouca consideração faz com quem está provendo o benefício (uma dica, não é o estado ou o governo).

Mas afinal, o que é justiça? Grandes filósofos se dedicaram ao tem, pelo menos até o fim da Idade Média. Na modernidade, a questão foi colocada em segundo plano. Para a corrente marxista, nem tem sentido, pois justiça seria um conceito burguês. Que as maiores meditações sobre o tema se encontrem antes do surgimento da burguesia é apenas um detalhe.

santo-agostinhoEnfim, fiz este texto para introduzir uma frase de Santo Agostinho que tem tudo a ver com o que penso:

Não existe justiça se é contra a realidade.

A aceitação _ o termo usado é importante _ da realidade é o primeiro passo para se pensar em justiça.

Termino com outro pensamento de Agostinho, este um tanto mais famoso:

Perdida a justiça, um reino nada mais é que um grande roubo.

Mark Lilla e a Mente Naufragada

Terminei de ler A Mente Naufragada. Algumas notas:

  1. O autor parte da idéia de reacionário, que seria aquele que tem uma utopia no passado. Ou seja, enquanto o revolucionário deseja criar uma utopia, o reacionário acha que ela já existiu e depois o mundo se desviou do caminho.
  2. Por isso ele age como um náufrago, que navega em um rio vendo destroços do navio que é a própria civilização destruída.
  3. Ou seja, para o reacionário vivemos em uma época de decadência pois em algum momento cometeu-se um grande erro e a civilização, pelo menos a ocidental, se desviou de seu rumo.
  4. Inicialmente ele analisa três autores que apesar de não serem reacionários, tiveram sua idéias assimiladas por correntes reacionárias, oriundas da direita conservadora americana.
  5. Apesar de abundarem estudos sobre a mentalidade revolucionária, faltariam estudos sobre a mentalidade reacionária, ou seja, da mente naufragada. Lilla se propõe a estimular estes estudos.
  6. Acho que o maior talento do Lilla é de resumidor de livros. Praticamente ele passa do resumo de um livro para outro, com alguns comentários seus.
  7. No fim, ele conclui, sem dar nenhuma evidência, que o maior perigo hoje são os grupos reacionários, meio que deixando entender que a mentalidade revolucionária está em completa decadência. E que, inclusive, grupos de esquerda, desiludidos com o fracasso do socialismo, estão repaginando idéias reacionárias para manter os movimentos vivos.
  8. O livro tem pequenos estudos interessantes, como o feito sobre São Paulo que o coloca dentro de uma tradição revolucionária, sendo uma espécie de Lenin para Jesus (Marx). Felizmente Lilla discorda desta visão, apenas aponta como um exemplo da esquerda utilizando um mito da tradição para criar um mito próprio.
  9. Ele critica a utilização do passado, e da criação de mitos do passado, para justificar um projeto de futuro, mesmo que seja para restaurar um passado que nunca existiu, como é o caso do reacionário.
  10. O problema é que levando ao limite, qualquer coisa boa que já tenha existido no passado e seja referenciada como algo perdido, seria classificado por Lilla como mentalidade reacionária. E essas coisas existem! Nem tudo é mito e invenção para justificar projeto de poder.
  11. Sobre a mentalidade reacionária em si, João Pereira Coutinho já tinha chamado atenção para o problema em seu livro sobre o conservadorismo.

ONU não é instituição filantrópica

Infelizmente, em pleno 2018, a maioria dos brasileiros continua acreditando que a ONU é alguma instituição filantrópica que está aí para fazer caridade e promover o bem da humanidade. Se já teve este propósito um dia, não sei, mas hoje está bem longe disso. Ela pode até estar empenhada em fazer o bem, mas é um bem muito particular, fruto de um entendimento de mundo de uma parcela bem reduzida da sociedade, os intelectuais progressistas.

A agenda da ONU é a agenda do PSOL. Temos que acabar com a equação que ONU = BOM. Ela não está acima do bem e do mal e não é critério de julgamento. Pouca coisa causou tanto mal para a humanidade, por exemplo, quanto a UNESCO. Ela não quer educar de verdade, quer formar o cidadão do mundo, pronto a viver dentro dos critérios que ela tem estabelecido para o planeta.

A ONU tem muito mais a ver com controle do que com liberdade. Quando as pessoas pararem de dizer amém a cada uma de suas resoluções no campo cultural e questionar seus princípios, talvez não sobre nada que preste. Ela é mais uma das idéias de Kant que deram muito errado. Ela pode até ter sido concebida com as melhores intenções, mas hoje é um organismo que procura gerar o caos para vender sua ordem. Ela é um mecanismo que hoje está nas mãos de loucos.

Gab, será que vai vingar?

Cada vez fica mais evidente que as redes sociais se venderam com a roupagem da liberdade mas o negócio deles é controle mesmo. Facebook, Twitter, Youtube, Instagram, Google, Microsoft e Apple estão agindo cada vez mais em conjunto em uma investida contra a direita em geral. Até partido político está sendo silenciado por não estar do lado certo.

O radialista americano Andrew Klavan teve uma grande sacada no programa de ontem. Trata-se da versão de internet para O Império Contra Ataca. Eles sentiram o golpe que os rebeldes deram no muro aparentemente intransponível da cultura politicamente correta e partiram para o ataque com todas as suas armas. Estão nos caçando perfil por perfil, plataforma por plataforma.

Desde ontem uma intensa migração de brasileiros do twitter para a plataforma Gab.ai aconteceu. A coisa foi tão assustadora que a plataforma sentiu o baque e começou a ratear. Hoje a Microsoft mandou um ultimato para eles; se não censurarem os posts que apontaram, vão perder a conta em seus servidores. Os donos do Gab mandaram a Microsoft para aquele lugar e informaram que já estão negociando outro local para seus servidores.

Não temos como saber se a iniciativa vai dar certo. Mas o surgimento de concorrência real aos baronatos do vale do silício vem em muito boa hora. Já abri minha conta lá. Vida longa ao Gab!

Procurem lá por @jotaramone

Eric Voegelin: Uma lição de humildade

Acabei de ler o capítulo de A Mente Naufragada, de Mark Lilla, onde ele trata de Eric Voegelin. Trata-se de um bom resumo da vida e das idéias mestras de Voegelin, mas o que chamou atenção mesmo de Lilla foi uma capacidade rara do cientista político alemão: o de reconhecer os próprios erros e assumir os custos. Ele era capaz, depois de publicar volumes de uma obra, de mudar de idéia e dar-lhe outra direção, porque entendeu que partiu de uma premissa que não se confirmou durante sua investigação. Ele não tinha medo de descobrir que estava errado.

Ou seja, trata-se de um cientista político que anuncia publicamente uma hipótese, publica os estudos resultantes desta hipótese e que, durante a investigação, percebe que estava errado e publica suas novas conclusões, admitindo seu erro, as razões de seu equívoco e a nova direção que vai seguir. Vocês tem idéia do quanto isso é raro? Existe que um intelectual tenha humildade, o que explica porque quase nunca acontece. Nas palavras de Lilla:

Mas talvez seja sua disposição de questionar publicamente seus próprios pressupostos e motivações, de abandonar certas idéias fixas e rever outras, o que mais tem a nos ensinar hoje.

Para Lilla, Voegelin tinha um espírito livre. Isso fazia toda a diferença.

O país do analfabetismo funcional

Somos o país dos analfabetos funcionais. Mesmo entre os que tem curso superior, uns 30% não conseguem interpretar corretamente um texto. Não tem dado mais significativo sobre o Brasil do que este.

No entanto, agimos como se isso não fosse verdade. Fazemos jornalismo, eleições, rede sociais, revistas, tudo como se o brasileiro fosse capaz de ler, e na maioria não sabe!

Ninguém toca neste problema. Só o que falam é de mais dinheiro. Investimento.

E o jornalismo? Acham que escrevem para o povo comum, como se este lesse artigo de jornal!

As redes sociais reúnem gente de nível social melhor do a média da população. No entanto, vemos doutores com livro publicado que não conseguem interpretar uma frase de 144 caracteres, que são incapazes de entender uma ironia.

Mas segue o teatro. Debates, artigos, análises. Tudo como se soubéssemos ler. É uma piada.

 

Sabedoria: fazer o que pode dar errado

Há uma frase do Herman Hesse que me deu o que pensar.

Sábio é aquele que sabe que algo pode não dar certo e mesmo assim o faz.

Parece um paradoxo, mas não e. O detalhe está no “pode”. Não é uma certeza que dará errado. A sabedoria está em fazer com todo cuidado para que dê certo. O estulto acha que não tem como falhar e, por ser displicente, não toma os cuidados necessários em sua empreitada. A sua soberba, o caminho para o fracasso. O sábio faz tudo pelo sucesso, mas prepara-se para fracassar. Este é seu diferencial.

Até que ponto as maiores tragédias humanas foram provocadas por aqueles que não achavam que poderiam falhar?

Cem Anos de Solidão: superestimado?

Terminei de ler Cem Anos de Solidão. Minhas notas:

  1. Sobre realismo fantástico, sou bem mais Borges. Nos contos do argentino, elas tem uma função na estória. Em Cem Anos, parece mais um exercício de futilidade.
  2. A concepção da obra é excelente. Pena que não foi Érico Veríssimo a realizá-la.
  3. Houveram capítulos que me interessaram, mas na maior parte não me conquistou. Uma pena.
  4. O Coronel Aureliano é o melhor personagem. Também é interessante a matriarca da família, Úrsula.
  5. Agora que penso, será que Gabriel leu O Tempo e o Vento? Tem muitas semelhanças.
  6. O que mais chamou-me atenção no livro foi a completa ausência de Deus na estória. Nenhum personagem tem relação com o transcendente, de nenhuma forma. Não sei se o autor pensou nisso, mas faz todo o sentido. Sem Deus, o homem se entrega a toda sorte de falsos ídolos. No livro estes ídolos aparecem na luxúria, desejo de poder, política, fascinação com o dinheiro, com o misticismo, ciências, médicos imaginários. Ou seja, sem Deus o homem não consegue se conectar ao outro e nem ser feliz.
  7. O mundo sem Deus é o mundo do eterno retorno e do homem como prisioneiro do destino. É o que acontece em Cem Anos. Os arcos se repetem, o que é acentuado pela repetição dos nomes.
  8. Se o livro é também uma alegoria sobre a América Latina, como dizem, então faltou um elemento primordial para entender a história da região: o catolicismo de seu povo. Nenhum dos personagens do romance tem fé.
  9. Não vou dizer que o livro é ruim, mas confesso que me decepcionei um pouco. Não o leria novamente.