Humildade e Soberba

Li neste fim de semana as questões 161 e 162 do volume 3 da Suma Teológica, de São Tomás de Aquino. Para quem não conhece a estrutura da suma, as questões funcionam como artigos ou capítulos. Elas possuem um tema central, que se desdobram em perguntas, cada uma com argumentos em contrário e a favor de uma tese. Coisa de gênio.

A questão 161 tem como tema a Humildade. Para Aquino é a abertura do caminho para as grandes virtudes, como a caridade. Sem humildade, não temos como chegar lá. Até pela abertura que ela dá para a verdade, que em última análise é o próprio Deus. Só podemos reconhecer a verdade se formos humildes. Interessante também são as 12 regras de São Bento para o humildade, que funcionam como degraus para a perfeição, começando com os sinais exteriores até o último grau, o temor a Deus. Não lembro quem deu a melhor definição para esta expressão. Temer a Deus é levar Deus a sério. Uma das formas de não temer a Deus é escutá-Lo, mas não segui-lo, como se não fosse importante o que nos foi dito.

Já a questão 162 foi mostrar o tema oposto da humildade, a soberba. Há vários tipos e graus de soberba, mas na essência a soberba está em se achar melhor do que realmente é, no limite achar que não precisa de Deus. Soberba é achar que você é suficiente, que tudo é mérito seu. Fico pensando nessa infinidade de livros de auto ajuda que centram tudo no eu, como se sozinhos fossemos capazes de decidir nosso destino. Tem um velho ditado que diz que enquanto fazemos planos, Deus ri. Significa que nossas ações são inúteis? Penso que não, apenas que temos que tê-las em perspectiva. Sempre será uma conjugação de nossos atos com a sorte, uma das palavras que traduzem a providência divina. Temos uma tendência de exagerar nosso próprio papel no sucesso e diminui-lo no fracasso.

Na questão da soberba, São Tomás também fala dos 12 graus da soberba de acordo com São Bernardo, que são oposições a cada uma das 12 regras de São Bento, só que a escalada é invertida. Enquanto que terminamos a humildade no temor a Deus, começamos nossa queda na soberba na falta da confiança em Deus, justamente o pecado de Adão. Embora a humildade não seja a maior das virtudes, a soberba é, sob certos aspectos, o maior dos pecados. São Tomás não a coloca entre os 7 pecados capitais justamente porque está geralmente na origem destes.

Voltando os olhos para os dias de hoje, o que vemos? Em que medida as redes sociais, com sua exposição contínua, não potencializaram nossa soberba? Temos uma percepção que o mundo está pior, principalmente pelos comportamentos que observamos. Esse mundo de confortos e certezas não estaria ligado a um homem mais soberbo e confiante em si mesmo? Chesterton aponta em Ortodoxia que uma característica do louco é que ele confia em si mesmo. Cada vez mais vemos governantes resolutos, confiantes e por isso mesmo tomando decisões trágicas. Pergunto se a soberba, e por consequência a falta de humildade, não seria o grande fator da modernidade.

Vivemos tempos difíceis e resgatar a humildade talvez seja a coisa mais importante a fazermos hoje.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *