O ódio destrói a pessoa. Por mais que alguém possa fazer mal a outra pessoa, o sentimento corrói principalmente quem odeia, a ponto de destruir seu espírito.
Pelo menos foi o que apreendi de duas obras esta semana.
A primeira foi o filme There Will Be Blood, conhecido no Brasil pelo título equivocado de Sangue Negro¹. O personagem principal Daniel Plainview é um homem amargurado desde o início e tem sobretudo uma luta de ódio contra Deus, pelos revezes que sofre durante a vida começando pela sua perna, passando pela surdez do filho adotivo, a forma como foi enganado pelo falso irmão e terminando na humilhação que sofre na igreja do falso profeta. Se vinga de todos, mas termina sozinho como um alcóolatra. Fez mais mal a si mesmo que aos outros, daí o sobrenome (visão estreita).
A segunda obra é o romance Jane Eyre, que estou pela metade. A personificação do ódio está na tia de Jane, a Senhora Reed, que até o fim se recusa a aceitar a sobrinha e morre amargurada recusando o consolo da única pessoa que no fim realmente se importou com ela. No início do romance, Jane se revolta contra os maus tratos, explode com tia e jura que vai odiá-la para o resto da vida. Só que com o tempo deixa de alimentar o ódio e no fim termina com pena da tia.
As duas obras, uma do cinema e outra um clássico da literatura, mostra que alimentar o ódio apenas consome o espírito, nos afastando da paz que precisamos para levar nossas vidas. No fim, somos consumidos por eles e nos tornamos uma espécie de monstros, pois o ódio nunca fica restrito, vai se espalhando por todas as nossas relações a ponto de nos afastar de todas as conexões reais, restando-nos a solidão que nos acompanhará em nosso fim.
O ódio é uma forma de atingir o próximo fazendo mal a si mesmo.
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¹ Os títulos em português, na maioria das vezes, são um equívoco porque passam para a pessoa uma perspectiva errada da obra. Sangue Negro induz quem assiste a pensar que o filme é sobre o petróleo, a cobiça do homem, capitalismo, etc. Não se trata disso. O petróleo é o contexto da história, que na verdade trata das relações de um homem ambicioso e amargurado com as pessoas a sua volta. Já o título original, There Will Be Blood sugere uma tensão, de algo sangrento está para acontecer, o que acaba acontecendo de forma até inesperada, com uma arma improvável. Infelizmente nossa indústria cultural, que entre outras coisas define o título em português, só consegue enxergar o mundo em termos marxistas, o que termina por colocar algo que é apenas material (a questão econômica) no centro de um filme que na verdade trata do espírito.