Por que as pessoas, quando ordenadas, fazem o mal ou por que aderiram ao nazismo?

Pergunta bastante complexa e que já teve muitas respostas.

Uma delas foi a experiência da máquina de voltagem, conduzida numa universidade americana (Yale ou Stanford?) em que voluntários aplicavam um choque toda vez que uma pessoa (um ator) errava uma advinhação. Um pesquisador pedia para a pessoa aumentar a voltagem a cada choque e mesmo com o ator simulando dores terríveis e até a morte, continuavam aumentando a voltagem. A conclusão foi que desde que alguem assumisse a autoridade, as pessoas comuns cumpririam qualquer ordem. Estaria neste experimento famoso a explicação para os campos de concentração, por exemplo.

No livro Humanidade, do Bregman, ele apresenta outro olhar para a experiência. Na verdade muitos que continuaram achavam que aquilo era um teatro, coisa que ignoraram no relatório final. Mesmo assim, ainda sobrava um número razoável que continuou. Bregman observou que antes da experiência, todos recebiam um discurso mostrando que aquela experiência era fundamental para o avanço da ciência e o pesquisador aparecia como alguém genuinamente interessado em ajudar a humanidade. A partir dos vídeos se torna evidente que o pesquisador sempre pedia a colaboração da pessoa para aumentar a voltagem e quando dizia que era uma ordem, elas imediatamente paravam.

Qual a conclusão do Bregman: muitas pessoas são capazes de fazer o mal desde que acreditem que estejam fazendo o bem.

A pandemia é a maior experiência humana deste princípio.

Pessoas comuns estão a um passo de se tornarem agentes da gestapo simplesmente porque acreditam que estão fazendo algo meritório.

Seguem minhas notas sobre o capítulo 8 do livro do Bregman:

  • Stanley Milgram: máquina de choque
    • experiência parecia mostrar a força da autoridade
    • maioria das pessoas obedece cegamente a autoridade instituída
    • problema: parecia mais colaboração do que coerção
    • maioria acreditava que estava fazendo algo de bom
    • boa parte não acreditava realmente nos choques
    • maioria parava ao receber uma ordem direita de continuar
    • o caminho do inferno é pavimentado por boas intenções
    • Adolf Eichmann
      • não era um homem comum
      • era fascinado pelo nazismo
      • acreditava que tinha feito o bem
      • confundiu-se sua defesa legal com o que realmente acreditava
      • Arendt: mal interpretada. Ela sabia que Eichmann era um fanático
    • Caso Dinamarca
      • maioria recusou-se a colaborar
      • protegeram os judeus
      • não foram “trabalhados” para achar quer o certo
    • conclusão: para colaborar, maioria das pessoas precisam ser convencidas que estavam fazendo o bem

A lenda do Graal

Depois de assistir duas palestras sobre o graal no excelente podcast Symbolic World, do Jonathan Pageau (procurem), me empolguei para ler o mais antigo manuscrito com uma das lendas do graal, o poema de autoria de Chretien de Troyes.

A versão que estou lendo é em prosa, o que facilita o entendimento, afinal é sempre uma questão complicada traduzir poesia.

No começo da história, um jovem (que não recebe nome, e isso é importante) caçando na floresta encontra vários cavaleiros, que confundem com anjos. O motivo é que sua mãe descrevia os anjos como as criaturas mais belas da existência, e com suas armaduras reluzentes o jovem se confunde. Na verdade, a mãe sempre escondeu dele as estórias de cavalaria para que ele não tivesse o destino do próprio pai, um cavaleiro, que não chegou a conhecer.

Ele pergunta pela serventia de tudo que os cavaleiros carregavam: lança, escudos, armadura. Depois de confrontar a mãe, parte para se sagrar cavaleiro, não sem antes receber vários conselhos: ajudar as damas em perigo, aconselhar-se com os mestres e não com seus iguais, sempre que encontrar uma igreja, entrar e rezar.

Na conversa com os cavaleiros, perguntam seu nome e ele responde: “meu filho”. Também é conhecido como “meu irmão” e “meu senhor”. Curioso porque a mãe lhe aconselha também a sempre perguntar pelo nome das pessoas, pois pelo nome se conhece quem é.

2022, o ano da divisão?

O Brasil está dividido faz tempo e a eleição de 2018 mostrou bem isso. Só que agora acho que a coisa vai para outro patamar. Além de divididos, caminhamos para uma ruptura definitiva entre as pessoas. Reforço esse “entre as pessoas” porque desconfio que nos meios políticos a coisa não é tão belicosa como imaginamos. Como diz um amigo, no fim eles dão um jeito de se entender e nós ficamos com o ódio.

A coisa é grave. Sou daqueles que acreditam que uma sociedade é formada pela amizade, pela idéia de um projeto comum. A partir do momento que ela é tomada pelo ódio, seu único caminho é o da destruição. Para manter uma sociedade unida desta forma só há um jeito, a força. Caminhamos para algum tipo de autoritarismo, mesmo que de forma disfarçada.

A tensão política só vai crescer no país e grande parte da culpa eu coloco no monte Olimpo que num ato completamente irresponsável fez pior que soltar quem alimentou por anos esta divisão, anulou todas as condenações e deixou-o livre para radicalizar na divisão. Um dia, tenho certeza, estes irresponsáveis irão pagar pelo que fizeram, nesta vida ou na outra.

Ainda tenho fé que Deus está dirigindo esta comédia brasileira e teremos um final feliz, mas acho que antes passaremos por uma séria provação, como nunca antes passamos. Como somos um povo de boa índole, havemos de superar, mas não sem muita dor e sofrimento.

São os meios daquele que divide, o diabolos. Só que já nos prometerem que as suas forças não prevalecerão. Esta é minha maior esperança para vencer no final, mas acho que teremos um 2022 brutal e talvez seja até necessário.

Um dia teremos paz.