The Family Man (2000): uma fábula de natal

It´s a Wonderful Life é meu filme favorito de todos os tempos. Até porque você pode identificar a influência de Chesterton em Frank Capra durante toda a estória, desde a relação com Deus, família, a sociedade, até os princípios econômicos.

Em 2000 lembro de ter assistido The Family Man no cinema, provavelmente em Belo Horizonte. Não dei muita atenção ao filme; pareceu-me uma destas comédias românticas tão comuns nos anos 90. Ontém, vi novamente e desta vez vi um filme inteiramente diferente.

Talvez a razão seja a maturidade. Assim como a peça Our Town e o próprio It´s a Wonderful Life, há obras que você precisa ter uma certa experiência de vida para realmente entender e apreciar. Como dizia o cineasta Eric Rohmer, filmes nos ensinam a ver. E o que nos ensinam estas obras? que a felicidade está nas coisas permanentes e não no efêmero, por mais gloriosos que possam ser.

No filme de Capra, George tem uma visão (um vislumbre segundo o “anjo” Cheadle) do que seria a vida de sua comunidade se ele não tivesse existido e o faz perceber o quanto tudo que ele fez na vida foi tremendamente importante e como ele era feliz sem perceber. Já em Family Man é tudo ao contrário. Jack se considera feliz. Tem dinheiro, poder e todas as mulheres que desejar. Seu vislumbre é ver o que seria se ele não tivesse embarcado 13 anos para Londres e tivesse se casado com sua namorada da faculdade, Kate. Se George Bailey percebe que era feliz e não sabia, Jack percebe que não era feliz como achava que era.

Ainda escrevo mais sobre este filme, mas adianto. Ambos os filmes me fazem perceber o quanto sou feliz e quanto devo valorizar tudo que tenho.

Algumas observações

  1. Tea Leoni nunca esteve tão bela.
  2. Nicolas Cage perto de James Stewart é brincadeira. Não dá.
  3. Our Town é uma peça indicada para adolescentes nos EUA, mas que eles não tem capacidade alguma de realmente entender. Daí a comparação.

Como saber se uma lei é boa?

Para alguns, a lei serve para coibir o espírito animal do homem. Para outros, para criar o novo homem, livre dos preconceitos que traz de forma reacionária da própria cultura. Cada vez mais acredito na intuição dos filósofos clássicos, o que constrói uma sociedade não é o medo, mas a amizade. Não é a competição característica do mercado moderno, nem a distribuição de privilégios, mas a colaboração em projetos comum.

Por isso, o grande teste para uma lei é responder esta pergunta: ela facilita ou dificulta a amizade na sociedade?

Há fatores conexos, como desenvolvimento da vida moral. A lei facilita ou dificulta uma boa conduta por parte das pessoas?

O que mais vejo são leis que provocam a desconfiança entre as pessoas e dificultam ter uma vida moralmente boa. Isso pela idéia que tomou conta dos legisladores que o grande propósito da legislação é corrigir os problemas da sociedade quando deveria criar condições para que a própria sociedade resolvesse seus problemas. Na mente dos políticos modernos, independente de lado, está a convicção que a sociedade é incapaz e apenas a burocracia estatal é eficiente para promover o bem comum.

Falam tanto de empoderamento, mas quem precisa se empoderado, de verdade, é a sociedade em relação ao estado, mas isso é assunto para outra reflexão.

O ser humano tem uma bondade intrísseca?

Que somos capazes das maiores maldades, ninguém tem dúvida. Só que também somos capazes dos maiores sacrifícios. O que prevalece? A exceção é o comportamento maléfico ou a bondade? Quem somos na realidade?

Há uma visão cínica, que prevalece especialmente nas redes sociais, que é taxativa em afirmar que a maioria é ruim e os que sobram, só conseguem ser bons até a página 2. Ou seja, se alguma coisa der errado, farão maldades também.

Os que acreditam que as boas pessoas predominam, que temos um instinto natural para a bondade, costumam ser ridicularizados.

Afinal, o que somos?

Como você faz para ler tanto?

Um amigo me perguntou por zap como eu fazia para ler tantos livros no ano (65 até aqui). Se eu conseguia guardar tudo que eu lia, se tinha algum método de leitura rápida.

Bem, vamos lá.

  1. Eu leio vários livros ao mesmo tempo. O motivo é simples: cada livro te exige um grau diferente de atenção. Se eu ficar em um único livro, por exemplo um Cidade de Deus do Santo Agostinho, só vou conseguir ler se tiver em condições muito favoráveis: descansado, sentado, com caderno de anotações ao lado. O risco é ficar semanas sem ler porque não estou nestas condições. Por isso, migro de livros. Estou cansado? Leio uma biografia ou um conto. Estou em condições de estudo? Um livro de filosofia ou de teologia. Quero ler um capítulo rápido de informação? Um livro da sociedade atual.
  2. Criei o hábito de ler pelo menos uma hora todos os dias. Tem dia que leio umas 3 horas, mas no mínimo leio uma hora. É raro o dia que isso não acontece. No meu caso, leio assim que acordo, antes mesmo de tomar café.
  3. Tenho sempre um livro a mão, e o kindle vem muito a calhar. Estou na espera de um consultório? Livro. No uber? Livro.
  4. Vejo pouca televisão. Leio mais livros que vejo filmes. São duas ou três horas que converto para a leitura. Procuro ver filmes que realmente façam valer meu tempo. Tirando alguns filmes bobos que vejo no fim de noite, quando estou cansado para ler e quero distrair a cabeça. Esta é a hora dos filmes “coca-cola”.
  5. Adoro falar, ler e assistir vídeos sobre livros. Isso cria o interesse e ajuda no hábito. E ajuda a lembrar o que estamos lendo.

Foi o que respondi por zap. Tem muito mais, mas acho que o principal está nestes cinco pontos.

Presépio: o boi e o burro

Apesar do presépio, como nós conhecemos hoje, ter sua origem em São Francisco de Assis, a representação pictórica da natividade já existia desde os primeiros anos do cristianismo. Há desenhos em catacumbas e esculturas em túmulos que remontam ao século IV. Além de Jesus, há duas figuras que aparecem em praticamente todas as representações. Errou quem disse José e Maria, pois há muitas que eles não aparecem. O que existe sempre, junto ao menino Jesus, é um burro e um boi.

Há uma razão teológica para tal e sua raiz está numa profecia de Isaías:

Conhece o boi o seu patrão, e o burro, o estábulo do seu dono.

É preciso entender esta profecia simbolicamente. O povo de Israel é o boi, que conhece o seu dono, Jeová, mas que tem dificuldades em segui-lo. O burro são os gentios, que carregam, como carga, os erros da idolatria. Jesus veio para salvar ambos: judeus e gentios. A representação da natividade reforça este entendimento.

Da mesma forma, os reis magos também representam os gentios e os pastores, Israel. A partir de um determinado período, os magos e os pastores passaram a fazer o mesmo papel na representação, mas na origem era o boi e o burro que significavam a adoração ao novo rei.

O natal é para ser afirmado e não escondido

Uma das maiores derrotas dos cristãos no mundo todo é ceder à pressão dos ateístas e deixar de desejar feliz natal para não gerar desconforto com outras religiões. Isso é um truque. O que se quer é que as pessoas deixem sua fé escondida dentro de casa, como se fosse uma coisa menor.

A religião faz parte de como vemos o mundo e como nos entendemos. Não há como ser um assunto de foro íntimo, ela nos molda em tudo que fazemos. O natal é para ser afirmado, e se alguém se sentir magoado por receber um honesto feliz natal de um cristão é porque tem sérios problemas e precisa se tratar. Jamais direi feliz festa ou feliz feriado.

É FELIZ NATAL! Em letras maiúsculas para não ficar dúvidas.

Era só o que faltava um cristão ter que esconder Cristo no dia de seu aniversário.

Dica de filme de natal: The Holly and Ivy (1952)

Queria ver um filme diferente este ano e vendo um anúncio destas maratonas de natal do canal TCM, que não tem no Brasil, interessei-me por este filme britânico de 1952. Acertei na mosca!

Primeiro porque o filme trata do natal, mas também do seu aspecto cristão, o que muitas vezes é esquecido no desejo de agradar a todos os públicos. Muitos filmes tratam da solidariedade, do renascimento, da volta por cima, etc, mas ignoram solenemente o que dá todo sentido à data, o nascimento do Cristo. The Holly and Ivy não é um filme religioso, mas tem a religião no centro, até porque o personagem central é um pároco e toda relação com os filhos foi pautada pelo medo que eles possuem de serem condenados moralmente por ele.

O pior é que entenderam totalmente errado o cristianismo. Como o pai afirma em determinado momento “eu falhei completamente, agora entendo porque nunca consegui de fato tocar a minha comunidade”. É um filme sobre dramas humanos, decisões difíceis e que sim, o espírito de natal, que é um espírito cristão, pode ajudar a lidar. O diálogo entre o pároco e sua filha Margaret é daqueles para emoldurar.

Belo filme.

 A fine caricature I’ve made of religion if that’s how it seems to me own children. Should be because of religion I have more sympathy and understanding for people. But I have, Margaret, I have. Do I seem the type of man that’d turn away from the sorrows of his own children?

Padre Martin

Uma boa sociedade

Uma definição interessante para o que seria uma boa sociedade é dada por Peter Maurin: é a sociedade em que é fácil ser bom. Neste sentido, São Tomás, na Suma Teológica, coloca que “É impossível manter-se o bem comum da cidade sem os cidadãos serem virtuosos, ao mesmo aqueles a quem cabe governar”.

Dois pontos se colocam, a necessidade da sociedade ser feita por cidadãos virtuosos e que ao menos os governantes sejam virtuosos.

É possível argumentar que para ter governantes virtuosos é preciso que os cidadão sejam virtuosos, mas será? São Tomás admite a possibilidade de ao menos os governantes serem, o que implica que pode acontecer de uma sociedade de cidadãos sem boas virtudes serem governados por alguém que as tenha, iniciando um processo de melhoria da própria sociedade ao criar condições favoráveis para desenvolvimento da virtude na própria sociedade.

Qual o caso do Brasil?

Que somos governados por patifes de toda espécie, parece uma tautologia. Mas e nós como povo? Somos predominantemente viciosos ou virtuosos?

Particularmente acho que nosso povo é bom e a grande questão é como nós permitimos que os piores nos governem?

Aí vejo um papel fundamental da elite, dos chamados formadores de opinião. Estes trabalham dia e noite para que a verdade não seja conhecida, que as pessoas sejam enganadas o tempo todo, justamente para perpetuar esse circo de horrores que nos governa desde o golpe de 1889. Mas admito que posso estar errado, que o povo tenha grande parte da responsabilidade por manter estes patifes no governo. Só acho que com o nível de educação e informação que recebem, não poderiam escolher muito diferente. Nosso problema vai muito além do voto e por isso mesmo nunca será solucionado pelo voto, a menos que por destino os melhores se tornem governantes.

A diversidade das leis (e um grande problema da modernidade)

São Tomás de Aquino distinguia 3 tipos de lei:

  1. Lei Eterna (sendo a lei divina a parte que é revelada ao homem)
  2. Lei Natural (a consciência do bem e do mal é um eco da sabedoria divina no homem)
  3. Lei Humana

A lei natural nunca está em conflito com a lei eterna ou divina, porque é uma consequência da razão natural, não está no domínio dos homens. O legislador humano não pode promulgar uma lei natural, apenas descobri-la.

Já a lei humana, por deficiência de nosso juízo, pode estar em conflito com a lei natural (ver Antígona, de Sófocles) ou divina. Daí vem um grande problema da modernidade, a pretensão do homem de revogar leis naturais pela lei humana. Ou seja, de criar o que é certo ou errado, um atributo da razão natural e não da vontade.

Quando o Ministro Barroso ou Fux falam em legislação progressista é disso que estão falando, de legislar sobre as leis naturais, o que é uma gigantesca ilusão. No fundo, só estão alimentando os próprios egos e brincando de Deus. É uma violação direta ao primeiro mandamento e uma dia serão julgados por isso. Que Deus tenha piedade de suas almas.

Bob Dylan, escritor

Desde que Bob Dylan venceu o nobel de literatura, para horror de alguns, fiquei curioso para conhecer um pouco de sua prosa. Ao contrário do que se diz por aí, Dylan não ganhou o prêmio por causa de suas letras, mas também por uma carreira como cronista e escritor. (Outro dia, quando elegeram Fernanda Montenegro para a ABL, compararam com ele. Uma injustiça tremenda, pois ao contrario de Dylan, Fernanda nunca escreveu uma linha relevante para um prêmio desses).

Pois este ano peguei para ler seu Crônicas, Volume I. O título é um tanto enganoso. O livro é uma autobiografia, na forma de crônica. Dylan conta um pouco da sua história, mas sem deixar de fazer uma análise arguta do seu contexto. Ao mesmo tempo que trata dor diversos personagens, famosos ou anônimos, que teve contato na vida, não deixa de fazer uma análise cultural do mundo em que vive, como um bom cronista faria.

Sua prosa é fluída e sua sinceridade um ponto alto. Ele é muitas vezes duro com si mesmo, e não doura palavras para descrever suas inseguranças e dúvidas existenciais. Embora eu tenha penado um pouco nos primeiros capítulos, muito voltado para a cena folk do início dos anos 60, coisa que não entendo quase nada, acabei me apaixonando pelo salto no tempo que realiza até o fim dos anos 60 e o ano de 1988, onde conta a gravação de Oh Mercy em uma mítica Nova Orleans. (Estou há dois dias escutando este disco sem parar. Uma pérola).

Enquanto escrevo estas curtas linhas, escuto Woody Guthrie, o grande herói e influenciador de Dylan.

Querem saber? Um nobel bem dado. Melhor que muito premiado por aí.

(Embora o Nobel tenha a mácula de ter ignorado Borges, uma vergonha).