Uma aniversário que comemoro profundamente

Hoje um dos meus heróis intelectuais comemora seu aniversário. Trata-se de um caso raríssimo pois a maioria das minhas referências já não mais vive entre nós. Se pensar bem, só ele e Jesus estão vivos.

Joseph Ratzinger, o Papa Bento XVI, é um dos autores que mais impactaram minha vida. É um dos responsáveis por minha reconciliação com a Igreja de Roma e um dos meus guias espirituais. Minha admiração por ele só cresce a cada linha que leio (e releio). Ninguém me ensinou a ler a Bíblia como ele.

Com ele me tornei uma pessoa melhor em muitos sentidos, não dá nem para começar a descrever o gigantesco impacto que ele teve na minha vida.

Sempre digo que ele é um dos dois grandes do século XX. O outro é Eric Voegelin. Teologia e filosofia nunca mais foram a mesma coisa para mim depois de ler os livros absurdamente maravilhosos de Ratzinger. É difícil não estar lendo (ou relendo) um livro dele. Faz parte de meus rituais de vida. A trilogia sobre Jesus, por exemplo, leio todo ano, desde 2016. Todo ano. Sem exceção.

Quando me deparo com um texto dele pela primeira vez, seja um livro, uma homilia, uma carta, fico profundamente admirado. Ele realmente me toca no fundo da alma.

Agradeço a Deus por tamanho presente. Um dia os católicos terão a consciência da grandeza de sua alma e pensamento.

Fugir para onde?

Há tempos tenho este pensamento, mas se tornou mais intenso na pandemia.

Estou cada vez mais me sentindo sem lugar na sociedade. Uma opressão que chega a ser sufocantes algumas vezes. A violação da realidade causa nas pessoas comuns uma angústia que não consigo descrever. O sentimento do absurdo é cada vez mais intenso.

A questão que me ocorre é que parece que está assim no mundo inteiro. Eu poderia até sair do país e largar isso tudo. Mas fugir para onde? Parece que a loucura é geral. A doença espiritual do homem moderno é a grande pandemia nos dois últimos séculos, como previu Nietzsche.

As vezes me pergunto se não são realmente os sinais dos tempos.

Machine Head(Deep Purple): um disco perfeito

Eu nem acho que seja o melhor disco do Deep Purple, mas é o mais perfeito. Contradição? Explico.

Um disco perfeito é aquele que não tem falhas. Além da sonoridade, é preciso que todas as canções sejam excelentes e que de uma certa forma, “se encaixem”.

É o que acho do Machine Head. Nem vou perder tempo falando dos clássicos. Smoke in the Water, Highway Star, Lazy, Space Truckin´ dispensam apresentações. É nas outras canções, as menos badaladas, que conferem ao disco a sua perfeição.

Maybe I´m a Leo, Pictures of Home e Never Before são maravilhosas. Em qualquer outro disco seriam destaques. Deram o “azar” de vir junto com obras primas da banda. Ficam um pouco ofuscadas, mas não para um legítimo fã da banda.

Ultimamente tenho escutado bastante Never Before, uma pérola que nunca dei devida atenção. Um grito de socorro de quem sofreu uma desilusão amorosa.

O Brasil de 2021: crise sacrificial

No capítulo 3 de a violência e o sagrado, Rene Girard utiliza a peça Édipo Rei para explorar a hipótese da crise sacrificial, onde a violência de todos contra todos parece que vai explodir a qualquer momento.

Surge então um mecanismo, onde as pessoas vão ficando cada vez mais parecidas entre si e passam a canalizar seu ódio para uma única pessoa, que reúne as condições ideais para que possa receber toda culpa. Ela será apontada como a grande responsável e sua eliminação será a condição para estabelecer a paz novamente. É o que Girard chamou de vítima propiciatória. Ela é propícia para canalizar toda a violência.

O antagonismo de cada qual contra cada qual é substituído pela união de todos contra um. (…) Os homens querem convencer-se de que seus males dependem de um responsável único do qual será fácil se desembaraçar.

Não falta no capítulo inclusive uma menção à peste que assola Tebas, uma das formas que a violência de todos contra todos se manifesta.

O Brasil está vivendo um alinhamento onde forças vistas como antagonistas (sorry, não resisti) passam a não somente se alinhar, mas a se tornarem indiferenciadas (onde termina o MBL e começa o PSOL, ninguém mais sabe). No movimento é preciso que todos tenham claro que o responsável é um só, que deve ser violentamente afastado.

O que segura este mecanismo é que para funcionar a sociedade deve realmente acreditar na culpa da vítima. As castas já estão convencidas, mas falta aquele detalhe: o povo.

Mas os abutres não precisam ficar tristes. Parece que estão, aos poucos, conseguindo o convencimento que precisam.

Suma Teológica: um esquema bem precário por zap

Outro dia, em uma discussão por grupo de whatsapp, tentei fazer um esquema rápido de como seria a estrutura da suba teológica. O resultado é o que se segue (sem edição).

Estrutura Básica da Suma Teológica.

É divida em questões, que seriam algo como um artigo moderno.

Cada questão é dividida em artigos, que são na verdade perguntas que dividem a questão. O artigo é a unidade básica da suma teológica. Podem ser lidos independentemente.

Bem, o artigo tem sempre 5 partes. São elas.

  1. Uma pergunta. Só admite resposta sim ou não. Isso é feito assim para que não tenha inúmeras respostas possíveis e impeça um pensamento dialético.
  2. Uma resposta aparente. É a tese que São Tomás quer refutar. Por isso tem a fórmula “parece que (sim ou não)”. Ele está admitindo que esta tese é aparentemente convincente.
  3. Argumentos em contrário: Ele apresenta, numerada, os argumentos (não são opiniões) que defendem a tese que ele quer refutar.
  4. Posição de São Tomás. Ele geralmente começa com um argumento de autoridade, geralmente citando a Bíblia. Só que ele sabe que o argumento de autoridade é o mais fraco. Ele faz uma explicação detalhada porque aquele argumento de autoridade estaria certo. Dividindo e explicando toda a questão. É o ponto onde ele usa a argumentação racional para explicar porque aquele argumento está correto.
  5. Lembram que os argumentos em contrário foram numerados? pois agora, depois de dar sua posição, ele refuta cada argumento um a um, explicando onde estaria o erro e porque não é assim.

Se usássemos o método dele, seria algo mais ou menos assim.

Questão: sobre o enfrentamento da pandemia.

Artigo 1: O lockdown funciona?

Parece que sim.

  1. Com menos pessoas na rua, há menos possibilidade… etc etc
  2. Com o comércio fechado tem menos circulação…
  3. Sem o funcionamento dos meios de transporte…

No entanto, a publicação X afirma que não há relação entre lockdown e transmissão do virus.

São tomás aqui faria todo o detalhamento da frase anterior. Usando a argumentação racional para explicar porque o lockdown não funciona.

Refutação dos argumentos em contrário:

  1. Apesar de haver menos pessoas nas ruas, não é possível isolar toda uma unidade familiar, e uma única pessoa que tenha contato com virus transmitirá com mais facilidade para toda sua família e ….
  2. Mesmo com o comércio fechado…
  3. Com menos transporte disponível há uma maior aglomeração….

Brasil colapsando?

Ontem conversei com uma fonte bem qualificada da indústria brasileira. A situação é bem pior que imaginava. A indústria está colapsando, e não é apenas por causa do covid, já vinha assim pelo custo Brasil, a baixa inovação tecnológica e um certo desprezo de vários governos, que vêem no agro-negócio o grande motor do Brasil. O paradigma, chegou a dizer a ele um ex-ministro da fazenda, é a Austrália.

Isso é sintoma de um país sem a menor visão estratégica. Austrália? A única coisa que temos em comum é o tamanho continental e talvez o clima. Só que lá não precisam gerar emprego para uma população de 200 milhões de habitantes. Agricultura tem por característica gerar poucos empregos, especialmente se altamente tecnológica como a nossa, e pagar pouco imposto também. Quem paga boa parte dos impostos neste país é justamente a indústria, especialmente a de transformação.

O Brasil precisa da sua indústria. Não somos Canadá e nem Austrália. Não temos um território gigantesco e pouco habitado. O que vamos fazer com nossas metrópoles? Com nossas imensas massas hurbanas?

Mesmo que se suspendesse todo lockdown agora, o que não vão fazer, o estrago já está feito. A população empobrecida não tem como consumir e boa parte da classe média, que sempre impulsiona a atividade econômica, está escondida em casa apavorada pelo terrorismo mediático que fizeram.

O Brasil é um barril de pólvora pronto para explodir e os agentes do caos acreditam piamente que a população se manterá pacata apesar de tudo que estão fazendo. Será?

O senso comum incomum de Aristóteles

Quando ouvimos falar da Aristóteles na escola, geralmente em aula sobre a história antiga, temos uma impressão de ser um gênio acima de nossa capacidade de entender, o que se confirma na maioria das aulas de filosofia, que costumam se prender muito na abstração de seu pensamento ao invés de priorizar a enorme relação com a realidade.

Aristóteles, assim como seu mestre Platão, partiu sempre do mundo real, de algo que podemos chamar de experiência comum. Ele tratou sobretudo do que é comum a todos nós e que pode ser expresso através de uma linguagem comum. Por isso a maior parte de seu pensamento será sempre atual. Ele não estava certo em tudo, mas em grande parte do que disse.

O que não significa que seu pensamento tenha parado no comum. Sim, ele partia do senso comum, mas nos apresentou uma forma de pensar que ia além da experiência comum e nos fazia compreender melhor estas experiências. O professor Mortimer Adler chamou esta capacidade de Aristóteles de censo comum incomum. Há um algo a mais em sua filosofia que ilumina tudo o mais.

A filosofia é, na essência, compreender o que já se sabe. Pelo menos era para Sócrates, quem a inventou. Foi na modernidade que assumiu, para muitos, um caráter quase exotérico, de conhecimento especializado para especialistas, praticamente uma anti-filosofia. Por isso que um diploma de filósofo geralmente significa um anti-filósofo. E por isso que digo sempre, muito seriamente, que há mais filosofia no Snoopy (e Calvin e Haroldo) do que toda filosofia moderna somada.

Exagero? Posso errar em um ponto ou outro, mas tirando algumas raras exceções, é isso mesmo. Charlie Brown e Calvin parte da experiência comum e fazem especulações bastante incomuns sobre elas. São espíritos realmente filosóficos. Já os que chamamos de filósofos criam sistemas ou teorias abstratas e tentam encaixar toda a realidade em um mundo imaginário que criaram.

Querem pensar bem? Se não conseguimos ler Aristóteles (ou Platão, Tomás de Aquino, Agostinho,…), leiam Calvin e Haroldo. Por via das dúvidas faço os dois.

Vacina para a impostura: Aristóteles

Ninguém aprende a pensar. Isto é uma das falácias da educação moderna, industrial, que pretende ser algo que não é. Se precisássemos aprender a pensar, nos comportaríamos como bebês a vida inteira e sequer aprenderíamos a nos comunicar. (Alguns bem que tentam continuar bebês durante toda a vida, mas isto é outra estória).

O que precisamos é aprender a ter clareza no objeto de nosso pensamento e fugir do falso entendimento da verdade. Muito do que Aristóteles nos ensinou tem a ver com isso. O grande problema é que nossa herança do filósofo são notas de aula, o que podem ser bem áridas de ler e entender.

Eu não conheço um livro melhor para introduzir o pensamento do grande filósofo do que o do grande educador Mortimer Adler chamado Aristóteles Para Todos. Esta sim é uma obra que faz jus ao título. Quer entender Aristóteles para ter mais clareza nos objetos do pensamento? Adler é a solução.

Um dia tenho que escrever sobre Mortimer Adler. Um verdadeiro educador.

3 músicas que ando escutando em 2021

1. Seventh Son of a Seventh Son (Rory Gallagher). O nome da música chamou minha atenção por causa da homônima do Iron Maiden. Um poderoso blues rock do Gallagher, com um riff hipnotizante.

2. Fall On Me (R. E. M.). Acho o ritmo desta música uma delícia.

3. Fly Me to The Moon (Frank Sinatra). Desafio qualquer um a não passar o dia cantarolando a melodia desta bela canção do “coolest singer” da história.

Não se esforçar é às vezes o melhor esforço

Há todo um paradigma moderno de vencer pelo esforço, o que muitas vezes é louvável. A persistência rende seus frutos. Mas será o único caminho? Um dos problemas que vejo na modernidade é uma certa fixação por fórmulas prontas, uma solução que encaixa em qualquer problema. No fundo, o homem quer se livrar do fardo de ter que pensar.

O esforço em uma determinada direção costuma gerar uma reação contrária no próprio espírito. Quanto mais um gago tenta falar, mas ele vai gaguejar. Quanto mais você tenta não ter medo de avião, mais parece que este medo se intensifica. Acredito que o grande esforço seja, pelo menos em várias ocasiões, não se esforçar. É preciso saber colocar um problema de lado para que possa retomá-lo depois, com uma solução mais amadurecida pelo próprio inconsciente. É preciso deixá-lo trabalhar esquecendo que ele existe.

Parece misterioso, eu sei, e falta-me ainda clareza para trabalhar estas idéias. Para isso serve um blog, para lançar alguns pensamentos desconexos e fazer uma primeira tentativa de colocar para si mesmo o problema. A filosofia, já disseram, é compreender o que já se sabe.

Seguindo estes fragmentos de pensamentos, vou deixar esta questão inteiramente de lado para que, se for o caso, tenham frutos.

Confuso, reconheço, mas quantas vezes grandes verdades se descobrem a partir de pensamentos inicialmente obscuros e conflitantes?