Dois Papas: notas iniciais

Com certeza vou escrever sobre este filme. Confesso que minha expectativa era baixa, muito por conta das críticas que li, especialmente do Bispo Barron, um dos melhores críticos culturais vivos. O Bispo reclama que o filme acerta no perfil do Papa Francisco, mas constrói uma caricatura do Bento XVI. Como sou um fã ardoroso deste último, desconfiei logo que não gostaria do filme e resisti a assisti-lo.

Pois bem, ainda bem que assisti. Desta vez discordo do Bispo. Notas para meu texto futuro:

  1. A primeira metade do filme é mais ou menos o que tinha lido aqui e ali. Bento XVI é um homem carrancudo, que articula para ser eleito Papa, tradicionalista ou extremo, incapaz de ver os “erros” da Igreja, responsável pela perda de fiéis por sua posição retrógrada.
  2. Jorge Bergoglio é um homem de bem, que se dá bem com todo mundo, humilde, popular, querido, o Papa que todo mundo pediu a Deus.
  3. Então o Bispo Barron estava certo? Aí que vem a sutileza do Fernando Meireles. Ele nos apresenta os dois personagens por seus esteriótipos, como possivelmente eram vistos um pelo outro. O primeiro diálogo, nos jardins, é um choque de duas personalidades e posições radicalmente opostas, uma disputa.
  4. Só que o filme não termina aí. No próprio diálogo do jardim temos a primeira pista para entender o filme, seja intencional ou não, a observação de Bento XVI que Bergoglio tinha certezas demais e que essa posição era orgulhosa. O próprio diálogo é sobre como Ratzinger deixa Bergoglio apresentar todas as suas posições, para realmente conhecê-lo muito além das fichas que possui sobre seus cardeais.
  5. No jantar, começamos a perceber que por trás daquele homem cizudo tem uma personalidade sensível, que sofre por não conseguir se comunicar bem com os outros. Na verdade, Ratzinger é um introspectivo, que à medida que ganha confiança, se permite ser mais espontâneo. E sim, Bergoglio tem um tanto de mente fechada para algumas coisas, e se espanta com as facetas que não imaginava ver em Ratzinger.
  6. Quando Ratzinger revela seu plano, Bergoglio conta seu passado e as sombras aparecem sobre sua personalidade. Ele reconhece seu orgulho passado e seus erros, mas mostra a agonia de quem ainda não se perdoou pelo papel que desempenhou na ditadura argentina.
  7. O que faz Ratzinger? Fica feliz pela fraqueza do adversário? Não, faz o papel que se espera de um padre. Lembra o colega argentino que ele é humano, que é pecador como todos são. Faz o papel de confessor e o absolve dos pecados.
  8. Em seguida o próprio Ratzinger se confessa. Comparem o contraste. Enquanto Ratinger escutou o colega em posição de reverência, procurando entender o lado dele, Bergoglio se levanta agitado e fica inicialmente horrorizado com o Papa, para depois se acalmar e dar a absolvição, mas sem fazer o mesmo papel de confortar que tinha recebido antes. Afinal, ali havia um homem em fim de vida, que lamentava não ter tido atitude mais firma com a questão dos abusos sexuais da Igreja, derrotado em sua missão principal do papado. Por que Bergoglio não o lembrou da mesma coisa? Que ele também era humano?
  9. No fim, acho que o filme acabou sendo mais simpático ao Papa emérito do que ao Papa Francisco, talvez sem a intenção por parte de Meireles, um progressista notório. Talvez seja produto da minha imaginação por minha admiração por Bento XVI, mas eu realmente fiquei emocionado em algumas cenas do filme, especialmente na confissão de Bento XVI e no momento que atravessa uma pequena multidão na capela Sistina.
  10. Não quer dizer que Bergoglio apareça no fim como uma pessoa ruim, longe disso. Apenas fica evidente que é um ser humano e como é difícil tomar as decisões corretas em todas as ocasiões.
Disputas entre homens de bem se resolvem com diálogo

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