Quis o destino, um nome que usamos para Deus, que o General Villas Bôas atingisse o ápice da carreira de um soldado, comandar seu Exército. Trata-se da maior de todas a missões que um profissional das armas pode receber. Ele assumiu seu cargo, com imensa confiança e energia, há quatro anos atrás. Não sei o que passava em sua cabeça, mas todos imaginamos um pouco. A imensa responsabilidade, os desafios, a oportunidade de colocar em prática suas idéias maturadas ao longo de sua carreira de imenso sucesso, o senho de transformar seu Exército. Seja o que for, o General não imaginava, ao prestar a continência ao General Enzo, assumindo o Comando do Exército de Caxias, que o destino lhe daria um imenso fardo para carregar junto com a responsabilidade que assumia: uma doença degenerativa que aos poucos lhe paralisaria os movimentos.
Por que? Como era possível tamanha injustiça? Como Deus permitia ter seus movimentos tolhidos no momento do auge de sua carreira? Como um Exército poderia ser liderado por um homem em uma cadeira de rodas?
Para piorar a situação, ele não estava vivendo tempos comuns. O Brasil atravessava a pior crise política das últimas décadas. Protestos crescentes, instituições em cheque, escândalos de corrupção em todos os níveis. Não, o General Villas Bôas não navegava em calmos mares; eram tempos de tormenta. Tão graves que ameaçavam partir o Brasil. O que fazer? Renunciar para que alguém com melhor saúde o substituísse? Ninguém poderia condená-lo em tais circunstâncias. Mas não estaria faltando com seu dever? Não deveria continuar até o limite de suas forças?
Quero acreditar que o destino lhe tomou os movimentos para que se concentrasse no que seu país precisava, sua mente e seu espírito. Naquele momento decisivo, o Brasil não necessitava mais do Capitão, do Major, do Coronel. Necessitava de seu General, um general que tivesse sua força em suas virtudes e em sua inteligência. Um General que fosse capaz de refletir sobre a grave situação de seu país, decidir com acerto e liderar sua tropa.
O exemplo que dava a cada dia de como enfrentar sua situação, foi calando os críticos e fortalecendo seu Exército e sua liderança. Quando a crise chegou no auge, não haviam mais críticos e todos estavam unidos em torno dele. Vejam bem, não se trata de dizer que doença lhe deu a confiança dos militares e da sociedade. Não. O que uniu todos em absoluta confiança a seu Comandante foi a forma como ele lidou com o desafio que lhe foi colocado.
Todas as vezes que o vimos em formaturas, visivelmente debilitado, ou em palestras, brincando com sua própria situação, fortaleceu em nosso espírito a consciência que estávamos diante de um homem que estava dando tudo de si para cumprir seu dever. Não podíamos desistir do Brasil porque ele não desistia. Não podíamos nos dedicar menos porque ele estava dando tudo que tinha.
Durante toda crise ele foi firme como uma rocha: não existe intervenção militar; o povo brasileiro não pode ser tutelado; as instituições cumprirão seu dever; devemos respeitar a constituição. Não foi um passageiro, não foi passivo. Nos momentos decisivos se mostrou presente, utilizando principalmente sua palavras; poucas, mas de imenso peso simbólico. O General Villas Bôas lembrou aos responsáveis pelo destino do Brasil o dever de cada um. Lembrou da constituição. Lembrou da responsabilidade das instituições. Lembrou de nossa pátria. E eles fizeram o que tinham que fazer. Não são poucos que consideram-no um dos que salvaram este país do desastre.
Hoje ele passou o comando. Sua voz falhava, mas sua mente continua lúcida e mais aguçada do que nunca. Com lagrimas nos olhos, nos emocionou a todos. Não existe maior satisfação para um soldado do que cumprir sua missão. De onde estiver, Caxias contempla orgulhoso, também emocionado. Nunca um militar brasileiro enfrentou um desafio como o dele com tanta privação de seu próprio corpo. E ele venceu.
Quando vi as imagens da solenidade de hoje, chorei. Emocionei-me pois tive a rara oportunidade de assistir, mesmo à distância, um grande homem. Já apertei a mão dele por três vezes, algo que me orgulharei para o resto de minha vida e poderei contar para meus netos, porque não tenho dúvidas que entrará para os livros de história.
Por tudo isso, obrigado, Comandante! O senhor nos deu uma baita lição de profissionalismo e, principalmente, de vida. O senhor foi grande quando mais precisou ser. E, no fundo, para quem fez tudo isso? Não foi para si mesmo, foi para que as novas gerações tivessem uma chance. Foi por todos nós.
Só poderia terminar este texto com o brado que tanto ama: Selva!
Cel QEM Marcos Heleno Guerson de Oliveira Junior