A Kind of Magic: como o Queen fez uma descrição visceral do mundo de hoje

Acabo de perceber que o disco A Kind of Magic (1986) do Queen tem uma unidade: o sonho da utopia realizada, uma utopia estabelecida pela ideologia, seja ela qual for.

O disco começa com One Vision. Uma visão. Um homem. Um espírito. Um mundo. Ou seja, uma visão unitária da existência, justamente o que prometem as ideologias. Hoje a dominante parece ser o globalismo, a crença em uma humanidade com pensamento único, sem fronteiras. A música alterna espasmos do sonho utópico com a necessidade de ação, um chamado às armas. Mas como fazer isso?

Aí vem a segunda faixa, A Kind of Magic. Só um ato de magia pode gerar este mundo utópico. Por magia entende-se um ato definitivo, imediato, capaz de destruir o mundo antigo e inaugurar uma nova era. “The bells that rings inside your mind, is challenging the doors of time, it´s a kind of magic”. A música canta que o ódio que dura mil anos vai acabar e que só pode haver a unidade.

One Year of Love toca outro aspecto das ideologias. O fim justifica os meios. Um único ano de amor vale por toda existência de sacrifícios. O que você precisa fazer? Render-se ao momento. A relação da pessoa com a ideologia é uma relação essencialmente amorosa, daí a impossibilidade de quebrá-la racionalmente. A dor de todo o processo é justificada porque “pain is so close to pleasure”, tema que é aprofundado na quarta faixa: Pain is So Close to Pleasure.

O aspecto dialético da revolução, seja armada ou cultural, se mostra nesta música do Freddie Mercury e John Deacon. “One day we love each other then we´re fighting each another all the time”. Só falta dizer que meu único pecado foi amar demais. O ato de destruição, para o revolucionário, é visto como um ato de amor para a humanidade.

O lado A termina com a famosa Friends Will be Friends, uma ode à camaradagem, que está no núcleo de todo grupo ideológico. A ideologia é uma justificativa para entrar em um grupo, mas é a lealdade uns com os outros que faz com que lá permaneçam. Basta lembrar a narrativa do coletivo do Pablo Capilé, onde os laços de amizade eram forçados ao ponto de destruir a individualidade da pessoa. “It´s easy now, cos you got friends you can trust”.

No lado B, temos outro hit do Queen, escrito por Brian May, Who Wants to Live Forever. Aqui, uma sutileza. Vida eterna é o que prometem as religiões transcendentes, especialmente o cristianismo. As ideologias tem como base a negação do transcendente, tudo que temos é o aqui e agora. “Forever is our today, who waits to forever anyway?”. Quem quer essa tal de vida eterna? Quem quer viver para sempre?

Gimme the Prize é o revolucionário clamando por seu prêmio. “Give me your kings, just give me the prize”. Explica um pouco porque o revolucionário, ao mesmo tempo que acredita nas forças históricas e que o paraíso prometido virá de qualquer forma, toma parte ativa para apressá-lo. No fundo, ele é um egoísta. Ele quer o prêmio. Ele quer a satisfação de ver o destino prometido se concretizar em sua existência.

Don´t lose your head tem pouquíssimas linhas, mas enfatiza a necessidade de não perder a cabeça. Os obstáculos existem, nem sempre as coisas vão dar certo, mas lembre-se sempre da fé na causa. “Remember love´s stronger”. Amor é a cifra para a utopia.

Por fim, Princes of the Universe, a vitória final. Here we are. Born to be Kings. We´re the princes of the universe. A utopia ao alcance das mãos. Fly the moon and reach the stars. Got the world in my hands. I´m here for your love. Os revolucionários utópicos se acham os verdadeiros príncipes do universo. São totalitários por natureza.

Não tenho a menor idéia se a banda fez este trabalho de forma consciente. A inspiração artística tem suas formas de se impor, mas se tivermos como chave interpretativa o sonho da utopia, todas as músicas são coerentes e expressam uma narrativa desde a visão única, passando pela disputa até chegar na vitória final. É a descrição de um pesadelo, hoje fruto muito mais de uma revolução cultural do que um processo de conflito explícito. Por isso mesmo, mais perigoso.

Quer saber mais? Tem meu vídeo no youtube.

Viktor Frankl

Escutei essa no podcast dos Náufragos, que aliás recomendo vivamente.

Francisco Escorsim resume o problema da busca do sentido.

Camus: a vida não tem sentido.

Sartre: a vida tem o sentido que eu quiser dar. Menos o transcendente.

Frankl: Nenhum desses filhas da puta esteve em um campo de concentração. Eu estive. Achei um sentido para vida e estes sentido não tem sentido se não estiver ligado a um supra-sentido (transcendência).

A visita ao Instituto de Artes de Chicago em Curtindo a Vida Adoidado

ferris art 2Uma das minhas cenas favoritas de Curtindo a Vida Adoidado (1986), filme do inesquecível John Hughes, é a visita ao Instituto de Artes de Chicago.

A imagem que mais gosto dessa cena é a do Cameron contemplando o quadro de Georges Seurat, A Sunday on La Grande Jatte (1884). Sobre o quadro em si, comento depois.

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O que me chama atenção é que Cameron realmente contempla o quadro. Hughes consegue mostrar a crescente atenção nos detalhes, chegando ao nível do ponto.

Detalhe a mais: a música que toca nesta cena é Please, Please, Please Let me Get What I Want, do The Smiths.

Pat Benatar

117899614Descobri Pat Benatar por uma indicação do Adrian Smith, guitarrista do Iron Maiden, que colocou o album Crimes of Passion entre seus 10 favoritos de todos os tempos. Fiquei curioso. Era o único de sua lista que eu não conhecia. Nem a cantora.

Adorei o disco. Lançado em 1980, tem uma certa fúria nervosa, ao mesmo tempo melódico e com um sentido de urgência. Além de um verdadeiro tesouro que é a faixa Hell is For Children, que a Benatar escreveu baseada em uma série de reportagens na época sobre abuso sexual de crianças.

Because hell, hell is for children
And you know that their little lives can become such a mess
Hell, hell is for children
And you shouldn’t have to pay for your love
With your bones and your flesh

 

Notas de Sexta: Queen, piratas, Ortega, Whitesnake e os náufragos

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Olá pessoal!
Eis minha lista semanal de 5 coisas interessantes que andei fazendo (inspirado pelo Tim Ferris 5-bullets friday)

Um livro que estou lendo –

A Ilha do Tesouro. Eu sei. Tinha que ter lido este livro na adolescência. Na época estava mais interessado nos best sellers e ignorava bastante os clássicos. I made a huge mistake.

Um filme que assisti no cinema _

Bohemian Rhapsody. Gostei muito a cine biografia do Freddie Mercury. Os vinte muitos finais, reproduzindo o show do Live Aid foi incrível.

Um podcast que descobri –

Os Náufragos. Francisco Escorsin e Jota B apresentam uma conversa sempre interessante sobre o mundo da cultura, nos mostrando como podemos extrair aprendizado para nossas vidas a partir de filmes, músicas e livros. Muito bom mesmo. Viciei.

Uma discografia que estou revendo –

Whitesnake. Aproveitando a leitura da biografia sobre a banda escrita pelo prolífico Martin Poppof, constato mais uma vez como era bom a primeira fase da banda.

Um pensamento –

El racionalismo es una forma de beataria intelectual que al pensar sobre una realidad procura tenter a ésta lo menos possible en cuenta.

Ortega y Gasset

Bohemian Rhapsody: primeiras impressões

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Gosto de registrar as primeiras impressões dos filmes que assisto, como apoio aos reviews que farei oportunamente, quando passo alguns dias refletindo sobre a experiência.

Ontem assisti a cine biografia do Freddie Mercury. O que achei? Eis as minhas primeiras impressões.

  1. O filme é muito legal.
  2. Freddie Mercury vive uma tensão permanente entre uma extrema auto-confiança musical com uma fragilidade incrível em sua personalidade.
  3. Um tanto dessa fragilidade vem de sua homossexualidade, mas não é só isso. A forma como ele se entrega às drogas e sexo sem limites mostra uma fuga constante no confronto com seus próprios demônios, que pode ser resumido a grosso modo em um enorme complexo de inferioridade.
  4. Freedie tem na música seu principal escape, o que não tem como funcionar por muito tempo. No palco ele é outra pessoa, senhor absoluto da audiência. Mas na vida pessoal, sua caminhada é cada vez mais para o abismo. Afasta-se de todos que ama e termina nos braços de um aproveitador e amante, Tom.
  5. Essas duas personalidades não tem como durar para sempre e uma hora ele tem que reconhecer que seu caminho é para auto-destruição. O que ele precisa fazer? Assumir sua própria personalidade e afirmar seu ego, para usar a linguagem da psicanálise.
  6. É a decisão que ele toma na cena que Mary o confronta.
  7. Freddy termina assumindo o centro de sua existência e unificando suas personalidades, tornando-se finalmente responsável por suas decisões.
  8. Há furos gigantescos na cronologia da banda, mas isso é secundário. Dá para entender as decisões de roteiro para enfatizar os momentos chaves do filme, como a exibição de love of my life no rock in rio ser colocado em 1979 para pontuar o fim do casamento de Freddie.
  9. A cena final, o mini show do Live Aid é sensacional. Coreografia detalhada, reproduzindo a apresentação do Queen no festival.
  10. Por fim, a narração cristão por excelência: paraíso perdido, pecado, queda, inferno, arrependimento, conversão, morte. Gosto de pensar que Freddy Mercury está no céu. Seria a prova que qualquer um de nós pode conseguir.

Whitesnake: Come and Get It

A banda Whitesnake sempre foi uma das minhas favoritas, mas curiosamente não a sua versão mais famosa.

Estou lendo a biografia do Martin Poppoff, Sail Away. O eixo condutor é como Coverdale mudou sua banda da Inglaterra para os Estados Unidos para estourar com o disco de 1987.

Pelo caminho ficaram Mick Moody, Bernie Marsden, John Lord, Ian Paice, Neil Murray, entre outros.

Veio a fase hair metal. Antes, uma transição com Cozy Powell e Mel Galley.

Não é muito minha praia.

O Whitesnake que eu amo é o do Live in the Heart of the City.

Meu disco favorito? Come and Get It.

Slide it In foi o último disco deles que realmente me tocou.

Depois disso, pouca coisa me interessou. Confesso que tentei, muito. Mas escutar os acordes de Bernie Marsden em Don´t Break my Heart Again e Lonely Days ainda me comove até hoje.

A vaidade e o jornalismo

O jornalismo tradicional está sendo destruído pela própria vaidade. E é preciso que isso aconteça para que se restabeleça seu verdadeiro papel.

Talvez o marco zero da auto-destruição do jornalismo seja Watergate. Foi um episódio que fez de dois jornalistas, celebridades. A partir daí, todo mundo queria ser o novo Woodward e Bernstein. Todo mundo sonha em derrubar um governo.

Ao mesmo tempo, temos um jornalismo em grande parte ideológico, em que falar de viés de esquerda é um enorme eufemismo.

Para piorar, um caso mais típico no Brasil, temos a imbecilização provocada pelo completo domínio cultural da esquerda a partir dos anos 60, que acabou com o debate público e criou uma geração que nunca experimentou o contraditório.

Em resumo, temos jornalistas despreparados, ideológicos e, acima de tudo, vaidosos. Receita para o desastre.

Três exemplos recentes mostram bem o quadro.

Entrevista do Jair Bolsonaro no Roda Viva. Em vez de fazerem entrevista, os jornalistas queriam destruir a candidatura do Capitão. O resultado foi vergonhoso, pois ao tentar fazer política contra um profissional, coisa que Bolsonaro efetivamente é, tomaram uma surra. O Roda Viva nada mais é que uma plataforma para que jornalistas sejam a estrela do espetáculo a custa de um entrevistado, seja ele quem for.

Jim Acosta. Vejam o vídeo completo. Ele não faz uma, mas duas perguntas ao Trump. O presidente responde as duas. Acosta tinha perguntado porque Trump tinha chamado a marcha dos hondurenhos que atravessavam o México de invasores. Trump explicou sua posição e o uso do termo. Acosta diz que não concorda e resolve dar uma aula do que seja invasor para Trump. Quando é interrompido pois tratava-se de uma coletiva e tinha mais gente para perguntar, resolve fazer uma terceira pergunta, agora sobre a Russia. O interesse público na coletiva é Trump e não acosta. Para comentar a resposta, o espaço é outro.

Por fim uma entrevista de Jordan Peterson à britânica Helen Lewis. Peterson tem um best seller na praça, fruto de seu trabalho como psicanalista e acadêmico. Ao invés de fazer jornalismo, ou seja, entrevistar o cara, ele resolve debater com ele. Esse é o maior exemplo de vaidade. Ela quer discutir como se fosse uma acadêmica, no mesmo nível de Peterson. Logicamente toma uma surra.

São três quadros que mostram o mesmo fenômeno, uma vaidade que faz com que o jornalista se coloque como centro da atenção, tentando usurpar do entrevistado a audiência que ele está recebendo.

O jornalismo está em desgraça não por causa de ideologia, mas da vaidade de jornalistas que não possuem o conhecimento que julgam possuir. Sofrem do efeito Dunning-Krueger (possuem conhecimentos superficiais e, por isso mesmo, acreditam saber muito mais do que realmente sabem).

Eles estão cavando as próprias covas.

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Jornalistas no espelho

 

Notas de Sexta: Whitesnake, um estranho paraíso, Paulo Cruz, Breakfast Club e um pensamento certeiro do Olavão

libertyemi

Olá pessoal!
Eis minha lista semanal de 5 coisas interessantes que andei fazendo (inspirado pelo Tim Ferris 5-bullets friday)

Um livro que estou terminei

A Coisa Não-Deus, do Alexandre Soares Silva. Como seria o paraíso baseado na cultura brasileira? Alexandre nos dá uma visão. Um local de anjos ateus que tem o prazer como valor e a frivolidade como consequência.

Discografia que estou revisitando

Whitesnake. Principalmente os discos do fim dos anos 70, os meus favoritos. Sempre achei bem melódico e interessante o som feito pelos guitarristas Bernie Marsden e Mickey Moody. Acho-os bem subestimados.

Um filme que revi

Breakfast Club (1985). Nunca canso de ver este filme; sempre encontro uma nuance nova que não tinha percebido.

Uma entrevista

A entrevista do Paulo Cruz no Imprensa Livre do Alexandre Borges (disponível no youtube) está imperdível. Trata principalmente do problema do racismo e de como o sequestro de uma agenda necessária pela esquerda fez mais mal ao movimento anti-racista do que trouxe qualquer benefício real.

Um pensamento

Um homem medíocre não acredita no que vê, mas no que aprende a dizer.

Olavo de Carvalho

Mas afinal, o que dizia Paulo Freire?

Pedagogia da Autonomia

Saberes necessários à prática educativa
Paulo Freire, 1996
Editora Paz e Terra
Paulo Freire foi um dos mais influentes educadores brasileiros e publicou este pequeno livro um ano antes de sua morte. Pernambucano, dedicou sua vida ao estudo dos problemas da educação sob a ótica da pobreza e da indignação com as injustiças sociais.
Pedagogia da Autonomia é sua palavra final sobre o processo educativo de maneira geral, tanto para crianças quanto para jovens e adultos. É sua tentativa de dar um fecho ao seu pensamento, tentando colocar quais seriam os pontos para a prática educativa, que envolve tanto discentes quanto docentes. Sua mensagem é dirigida particularmente para os “professores progressistas”, justamente aqueles que estariam empenhados na busca de um novo mundo através da revolta constante contra as injustiças sociais e o domínio das elites. Seu alvo é o chamado “professor reacionário” que estaria preocupado em transmitir conhecimentos estéreis como forma de manter a população na ignorância para não alterar o status quo.
Para Freire, não há docência sem discência. Professor e aluno são igualmente sujeitos no processo ensino aprendizado e o grande papel do professor não seria transmitir conhecimento, mas ensinar o aluno a pensar certo. Para tanto, deveria estimular no aluno e em si mesmo a curiosidade que levaria de uma ingenuidade inicial para um estado de dúvida metódica ao dedicar-se com rigor à busca dos saberes de cada objeto. Outro ponto importante é que os saberes do educando deveriam ser respeitados e que seria fundamental o reconhecimento e a assunção da identidade cultural tanto do professor quando do aluno. O aluno teria que tomar consciência de que era explorado por um cultura capitalista e que tinha um papel ativo para não só se revoltar contra o sistema injusto, como para provocar uma revolução contra as elites dominantes.
Desta forma, ensinar não é simplesmente transmitir conhecimento, mas entender que o educando é sujeito de uma história em movimento, composta de processos dialéticos, condicionado por um sistema cujas principais ferramentas era o domínio midiático e o papel exercido pelos professores reacionários que transmitiam aos alunos a idéia de fatalismo deterministas, que se expressaria na constatação que a pobreza sempre existiria no mundo. A educação progressista era o instrumento para a mudança necessária à sociedade pois transmitia que a mudança era não só possível como uma questão de justiça.
Por fim, defende a especificidade humana da educação que exige segurança, competência profissional e segurança por parte do professor. Mais do que isso, exigia que o professor estivesse comprometido com o processo de transformação do mundo e que entendesse que a educação é essencialmente ideológica.
Lendo as páginas de Pedagogia da Autonomia senti uma grande tristeza pelo enorme desperdício de capacidade que a ideologia provoca em um intelectual. Freire consegue ver os grandes problemas que marcavam a prática pedagógica no Brasil. Realmente o processo ensino-aprendizado baseado inteiramente no professor e com alunos apáticos recebendo conteúdos era uma constatação de muitos casos. O grande problema de Freire, e de todos os que se deixaram levar pelos sonhos ideológicos, é que tudo que vê é filtrado pelas lentes da ideologia e o mundo que descreve começa a ficar longe da realidade.
Se lembrarmos de nossa escola, vamos perceber nitidamente que haviam professores autoritários como descritos por Freire, mas havia também uma série de bons professores e alguns deles de pefil autoritário. Longe de defender um modelo de ensino que teve sua época, e foi capaz de gerar toda a ciência moderna, a velocidade de informações do mundo moderno exige a gradual transformação da forma de ensinar, ainda mais quando se vai desvendando os processos mentais envolvidos na aprendizado, embora estejamos longe de entender realmente como conhecemos as coisas.
Ao dividir o mundo em classe exploradora e classe explorada, seguindo a utopia socialista, Freire se torna incapaz de ver o mundo e o resultado são as distorções que apresenta em Pedagogia da Autonomia. É capaz de condenar a influência da ideologia na educação, mas para ele a ideologia é o neoliberalismo; o socialismo seria apenas um grito de socorro dos oprimidos. A autonomia que defende é uma prisão mental, onde o indivíduo deixaria uma possível apatia fatalista pelas lentes ideológicas do processo revolucionário. Refletindo seriamente, qual a pior prisão?
As idéias de Freire estão na raiz da transformação que as escolas brasileiras foram submetidas nas últimas décadas a partir dos cursos de pedagogia e licenciatura: o professor autoritário e conservador que Freire enxergava foi sendo substituído pelo professor progressista cheio de boas intenções que considera ensinar português e matemática um coisa menor, o mais importante era educar para a cidadania, entendida aqui sob o ponto de vista revolucionário de inspiração marxista. Fica fácil entender como o Brasil chegou às questões do ENEM que cobra cada vez mais a visão progressista do mundo do que o conhecimento necessário para que a pessoa possa pensar por si mesma.
Freire parece ignorar que uma criança encontra-se em uma posição altamente influenciável por seu professor ao defender que este aproveite a prática pedagógica para mostrar sua visão de mundo e confiar que um “debate” entre professor e aluno levará ao conhecimento através do processo “dialético” que caracteriza o processo ensino-aprendizado. O que propõe é simplesmente o estupro ideológico, com todas as consequências que vemos hoje nas escolas do país, tanto públicas quanto privadas.
Fala-se muito sobre a transformação educacional no Brasil, talvez o primeiro passo seja extirpar dela os componentes ideológicos que foram instituídos a partir de idéias como as de Paulo Freire. Existem uma série de idéias aproveitáveis de seu trabalho, o que se faz necessários é limpá-las da ideologia e colocá-las a serviço da verdadeira educação, a que não está preocupada que o aluno aprenda a “pensar certo” sobre determinada ótica, mas que consiga pensar sobre a verdadeira natureza das coisas. O que sempre será impossível para uma mente formatada pela ideologia, pelo menos enquanto não se libertar das amarras que foram impostas pela “pedagogia da autonomia”.