The Post: um jornalismo que não existe mais (se é que existiu um dia)

the-post-tom-hanksPoucas coisas são tão instrutivas do que escutar o jornalista falando de si mesmo. Buscar a verdade, policiar os governantes, informar o público, esteio da democracia e, minha favorita,  falar a verdade para o poder. Em uma era do discurso, uma cortesia da pós-modernidade, é difícil não admirar uma conjunto de pessoas com ideais tão nobres e dispostos a nos servir.

O problema é a tal realidade. Onde estavam estes jornalistas quando o quadrilhão comandado pelo ungido saqueavam o Brasil de norte a sul? Quando olhamos o que aconteceu, o jornalismo esteve sempre a esteio das investigações e denúncias. Roberto Jefferson procurou a jornalista da Folha para dar a entrevista que começou a expor o mensalão. Em seu depoimento na Câmara dos Deputados, ele foi dando as instruções para a imprensa: procurem a agência do banco rural no prédio tal, tem uma lista de deputados que sacavam o dinheiro, etc, etc. Quando veio o Petrolão, eram os depoimentos e coletivas do Ministério Público que pautavam o jornalismo. A impressão é que se não fosse a movimentação dos próprios políticos, PF e MP, nada teria aparecido. O jornalismo investigativo desapareceu. O que está sendo feito é controle de danos.

O filme The Post mostra o que seria um jornalismo de verdade. A grande pressão no filme é chegar na frente do concorrente e expor as vísceras do poder. É interessante que os papéis do pentágono atingissem tanto republicanos quanto democratas, embora o filme tenha colocado ênfase no Nixon e não nos maiores responsáveis pela lambança no Vietnã: Kennedy e Lyndon Johson, mas é preciso sempre pagar um pedágio em Hollywood. Pelo menos no filme, os jornalistas partem para a ofensiva, buscando as evidências para poder publicar, inclusive questionando o problema da amizade dos membros da imprensa com políticos. A única coisa que importa é o furo jornalístico.

Se o filme retrata a verdade, lamento dizer que isso é passado. O jornalismo norte-americano não está investigando a máquina montada no governo Obama para investigar adversários, está publicamente pedindo que as provas não sejam divulgadas. Isso mesmo, não querem saber. Já decidiram que aquilo é falso e estão mais preocupados em derrubar Donald Trump. Trata-se da corrupção intelectual denunciada por Flávio Gordon. Os jornalistas são prisioneiros de sua ideologia e a grande prova é que enquanto o povo divide quase igualmente seus votos entre conservadores e socialistas, a classe responsável pela informação vota 90% democrata. Basta comparar as análises com os press realease do partido: impossível notar diferenças. Até as expressões são as mesmas.

The Post é um filme muito bom, mas uma fantasia nos dias atuais. Eco de uma época que se foi, em que jornalistas não tinham pretensões intelectuais e não ligavam para as próprias reputações. Haviam os jornalistas engajados, mas eram a exceção. Hoje são a regra. Hoje não temos mais jornalismo de verdade, mas assessoria de imprensa. O jornais não estão morrendo, estão se suicidando.

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