Quando o Congresso Nacional impediu que o presidente Collor concluísse seu mandato diante da evidência de corrupção em seu governo, a democracia brasileira saiu fortalecida. Havíamos concluído um processo contra o presidente da república sem que o país entrasse em uma crise institucional e sem ameaças de golpe.
Em 2005 o Brasil conheceu a essência do governo Lula. Compra de votos de parlamentares com dinheiro público era apenas a face mais vistosa. Tinha de tudo, corrupção, uso do estado para atender ao partido, farra entre ministros e empresários, abuso de poder. Nunca tantas evidências de corrupção de um governo surgira em tão curto espaço de tempo.
Naquele momento a democracia brasileira teve um senhor teste. Poderia um presidente ser deposto legalmente por crime de irresponsabilidade sem o apoio expressivo da sociedade? Lula tinha índices de popularidades bem abaixo do atual, mas mesmo assim bem acima de Collor em 1992. Poderia ter recebido o impeachment?
Falhamos miseravelmente no teste. A oposição foi incapaz de formular o pedido, a questão não chegou nem ao plenário do Congresso. Na democracia brasileira, as leis não eram soberanas. Criou-se a tese que um presidente poderia fraudar as leis, desde que não perdesse o apoio popular. Isso não é democracia.
Em 1972 Nixon foi re-eleito presidente dos Estados Unidos com uma votação arrasadora. McGovern, o queridinho da mídia liberal, conseguiu míseros 17 votos no Colégio Eleitoral. Não conseguiu vencer nem nos liberais estados da Califórnia e Nova Iorque.
Dois anos depois renunciou durante um processo de impeachment. Nixon ainda era um presidente popular e não havia evidências que perderia o mandato. Hoje a historigrafica americana começa a colocá-lo sob uma nova perspectiva; talvez tenha agido com um estadista ao optar por não levar seu país a uma divisão quando o inimigo soviético ainda era ameaçador.
O próprio presidente Clinton, também popular, enfrentou um processo. Ao contrário de Nixon foi até o final e conseguiu concluir seu mandato. O país ficou literalmente dividido e essa foi a herança que Bush recebeu. Além de um ataque devastador de terroristas islâmicos.
Nos dois exemplos americanos a democracia foi testada e aprovada. Pode-se discordar de uma ou de outra atitude dos presidentes; não do processo legal. Em qualquer um dos casos o presidente, a despeito de sua popularidade, não se colocou acima das leis.
No Brasil percebe-se hoje que Collor só perdeu seu mandato pela trapalhada de sua equipe econômica que falhou miseravelmente no cobate à inflação. A economia tem um peso enorme sobre a popularidade de um presidente e Collor pagou o preço. Tivesse popularidade, teria concluído seu governo.
No caso de Lula a democracia brasileira mostrou sua imensa fragilidade. Diante das evidências gigantescas de corrupção o presidente valeu-se dos índices de popularidade, e depois dos votos, para manter-se no poder. As leis foram solapadas.
Tudo isso é muito ruim porque vai consolidando no pensamento das pessoas que a democracia não é um bom modelo, o que abre a porta para os monstros morais. A falha dos políticos em defender os princípios legais em 2005 ainda pode resultar em males ainda maiores do que deixar a nação ser saqueada por um partido bandido. Podemos acabar ainda menos democráticos, em um regime próximo de gente com Hugo Chávez, uma semi-ditadura com roupagem democrática.