Ali Kamel comenta em artigo no Globo sobre o marketing político, capaz de criar personalidades através da dissimulação e da mentira. Muitas vezes estes políticos, despidos de idéias próprias, acabam eleitos mas argumenta que a longo prazo acabam sendo descobertos. É uma visão otimista do autor, de certa forma ele subestima o poder dos falsificadores da história capazes de manterem inverdades por muito tempo.
Kamel remete à democracia o poder de desnudar os falsos ídolos e refuta o argumento que a democracia é capaz de criar monstros citando o exemplo de Hitler.
Sei, essa frase pode parecer otimista, e haverá sempre quem diga que é justamente a democracia que permite que fenômenos como esses aconteçam. É uma visão equivocada. Quando há democracia, ela não falha, e este é o nosso caso: figuras assim, aqui, acabam despidas. Sei que há aqueles que citam sempre Hitler como prova de que a democracia, às vezes, falha e cria monstros. Não cria. Hitler chegou ao poder não porque tenha vencido uma eleição (em nenhum pleito o Partido Nazista recebeu a maioria absoluta dos votos), mas em decorrência de conchavos entre líderes políticos que se achavam mais espertos do que ele. No primeiro gabinete que chefiou, além de Hitler, só havia mais dois ministros nazistas. Menos de um mês depois, houve o incêndio do Reichstag (forjado, ao que tudo indica, pelos próprios nazistas), e Hitler arrancou do presidente Hindenburg um decreto lhe dando poderes ditatoriais. Em seguida, fez o Congresso aprovar uma lei que dava a ele todos os poderes legislativos. Ora, aí está o “x” da questão. Uma democracia que dá ao presidente o poder de baixar um decreto como aquele e ao Congresso a possibilidade de abdicar de suas próprias obrigações em favor do Executivo pode ser chamada de democracia? Não pode, este é o ponto.
Baseado nos mesmos argumentos percebemos que a Venezuela não é uma democracia e o Brasil está no mesmo caminho. Aqui o presidente governa por medidas provisórias e o congresso passa o tempo com elas. As principais são aprovadas pela imensa força de captação do executivo, o congresso brasileiro é subserviente, abriu mão de sua prerrogativa de legislar.
Dentro deste quadro, em que não temos democracia autêntica, o caminho está aberto para aventureiros e gangsteres políticos, como definiu Paul Johnson. Estamos presos em uma armadilha que torna a sociedade incapaz de reagir ao crescente abuso do poder do estado; para piorar a situação a sociedade clama por este abuso.
É preciso entender que o Brasil não é uma democracia plena; estava no caminho, desviou-se. O maior problema é que a cada dia fica mais difícil corrigimos este rumo, se é que ainda é possível.