Em artigo hoje, na Folha, José Paulo Cavalcanti faz uma defesa da TV Brasil. Não é uma defesa direta, pelo menos no lead. Coloca duas perguntas e ao longo do texto apresenta seus argumentos. Cavalcanti é um dos membros do conselho curador da estrovenga.
Achei particularmente interessante a primeira questão que colocou: ela vai fazer propaganda do governo? Diz ele que é fácil de responder: não se sabe. E isso vem de um dos membros do seu conselho! Poderia ter negado, dito que a função dele era justamente evitar esta utilização, mas saiu-se com este “não se sabe”. É uma das formas mais comuns no debate brasileiro, ao invés de defender sua posição e apresentar seus argumentos, o debatedor se coloca como juiz da própria questão que colocou, como se fosse um árbitro imparcial; tanto que em nenhum momento o Sr Cavalcanti referiu-se ao cargo que ocupa na TV. Provavelmente preferia que a Folha nem colocasse esta informação no rodapé do artigo.
É claro que não é um “não se sabe” comum, é um truque semântico. Cavalcanti sabe sim, tanto que acrescenta logo a seguir:
As biografias do ministro Franklin Martins; da presidente da TV, Tereza Cruvinel, e sua equipe; do presidente Luiz Belluzzo e dos demais membros do Conselho Curador não autorizam admitir que essa TV seja usada, hoje, como chapa-branca -assim se referem a ela alguns jornais.
Gostaria que o autor tivesse apresentado um argumento (coerente) para que as biografias das pessoas citados servissem para garantir a independência da TV Lula. Franklin Martins participou de grupos armados, de seqüestro, e é envolvido com um jornal delinqüente que faz apologia ao assassinato de jornalistas. Foi demitido da Globo por não ter conseguido apresentar um argumento coerente (esse pessoal tem dificuldades nesta parte) para refutar a acusação que lhe fez Diogo Mainardi. Este o acusou, vejam só, de ter ligações com o governo, citando uma série de parentes empregados sem concurso em cargos de confiança. Cruvinel passou toda a crise de 2005 falando no “suposto” mensalão e na defesa de José Dirceu, e vejam que o crime já tinha sido admitido pela cúpula do partido e até pelo presidente Lula no famoso “fui traído”! Beluzzo é sócio e membro do conselho editorial de uma revista de quinta categoria, mas muito bem patrocinada por estatais, chamada “Carta Capital”. Ah, esta revista também advoga que o mensalão não existiu.
As pessoas citadas são mais provas da adjetivação de “carta-branca” da nova TV do que o contrário. Mas Cavalcanti, agindo como uma espécie de Salomão, joga seus nomes ao ar como se não precisasse de outros argumentos. Pois precisa, ainda mais depois de citar estes nomes.
Nem vou entrar na segunda questão, a que coloca se um país com sérias carências sociais pode financiar uma tv pública. Cavalcanti faz sua defesa, para que não se julgue por enquanto, como se a TV pública fosse um sucesso de audiência. Enumera questões de ordem como que a tv tem que ser a “cara” do país, ser multi-cultural, etc. Não comenta o fato da audiência ser um traço. Isto mesmo, é tão insignificante que não consegue ser medida. Como as demais tvs públicas do país. Poderia ter colocado a questão de forma mais precisa: pode um país carente socialmente financiar uma tv pública que ninguém assiste?
Em resumo: um membro do conselho da TV Lula, se coloca como um árbitro, julgando duas questões que ele próprio colocou, mas assumindo claramente um lado. Pior, sem apresentar um mínimo argumento para este lado, limitando-se a citar biografias (um refúgio) e idéias abstratas do que imagina que seja a função de uma televisão. Uma lástima.