A maior parte da mídia brasileira, junto com os analistas americanos, consideram Lula um contraponto à Hugo Chávez. Outro dia, até Merval Pereira, que escreve bons artigos de opinião, classificou nosso presidente como “esquerda moderada”. Volta e meia surgem pequenas notícias que dão conta que Lula estaria “irritado” com as diabrices do venezuelano.
Lula só não faz no Brasil o que Chávez está fazendo na Venezuela porque não pode. Simples assim. Até porque o Brasil é o país mais importante no mundo a afiançar o que acontece na Venezuela. Está claro nas palavras ditas ontem:
“Podem criticar o Chávez por qualquer outra coisa. Inventam uma coisa para criticar. Agora, por falta de democracia na Venezuela, não é.“
Querem mais?
“O que não falta no país é discussão. Democracia é assim: a gente submete aquilo que acredita, o povo decide e a gente acata o resultado. Se não, não é democracia“.
É a velha tese totalitária de que a democracia permite tudo. O nazismo e o fascismo foram amplamente populares em sues países enquanto duraram, isso os justifica? Se a maioria de um povo decidir exterminar uma minoria, pode? Se fizesse uma consulta popular sobre o destino de Renan Calheiros e a ampla maioria decidisse pela forca, tudo bem?
A esquerda, quando lhe é interessante, sempre defende a consulta popular, como se o Congresso não fosse uma expressão legítima para expressão da população. O brasileiro seguramente não é, por fatores culturais e, principalmente, por nossa forma eleitoral esdrúxula. Mas a solução não é eliminá-lo. Ruim com ele, pior sem.
O discurso de Lula II justifica uma ditadura. Não custa lembrar que Saddam Hussein era constantemente eleito por 100% dos votos. Era um exemplo de democracia o Iraque, não?
Esse é o presidente que disse há alguns anos que na Venezuela existe “democracia até demais”. A imprensa preferiu dar a esta frase uma conotação de mais um ato falho, uma frase dita sem pensar. Pois está aí no discurso de ontem. Só falta lamentar que no Brasil exista menos democracia que na Venezuela.
Novamente defendeu o direito de Chávez perpetuar no poder, comparando-o com Thatcher, Mitterrand, Kohl. Todos, é claro, chefes de governo, não de estado. Um primeiro-ministro é eleito sem mandato fixo. Pode durar alguns meses, como já duraram, ou muitos anos. Tudo depende do seu desempenho, enquanto contar com a confiança do parlamento, que É expressão da vontade popular, permanece. No dia que perder, cai. Se fosse primeiro-ministro, Lula teria caído no mensalão. Teríamos tido novas eleições e um novo Congresso, menos petista.
Lula na verdade não defende só Chávez, defende também seu próprio direito de se perpetuar no poder. Como? Com uma mudança na constituição, via parlamento ou plebiscito. Por que não o faz? Porque não pode, ainda. Tudo que saiu até agora sobre o terceiro mandato é balão de ensaio, para ver a aceitação. Por enquanto os petistas percebem que não há condições políticas, a negociação da CPMF mostra o que seria no congresso a negociação por um terceiro mandato, e o preço que corresponderia.
Não, Lula não é um esquerdista “moderado”. É um dos membros fundadores e atuantes do Foro de São Paulo, o que nunca negou. O objetivo é transformar a América Latina em um continente socialista, o lixo que a Europa rejeitou, finalmente, em 1989. Cada governo socialista avança, na velocidade que lhe é permitida, para alcançar este objetivo. Mas avançam.