Um dos temas que tenho me interessado ultimamente é o anti-americanismo na América Latina, particularmente no Brasil. Confesso que até bem pouco tempo padecia deste mesmo mal, tão bem retratado em duas obras que li recentemente: O Manual do Perfeito Idiota Latino-americano e A Grande Parada. Uma das constatações recentes é de que os americanos são mais odiados no Rio de Janeiro do que em Bagdá. Que existem áreas em São Paulo, intelectualizadas, que a repulsa é maior do que em Terã __ um lugar onde os Estados Unidos são chamados de Grande Satã.
Um dos aspectos deste quadro é a questão do entretenimento, particularmente a televisão. Ou os famosos “enlatados” como são referidos por aqui. No caso me prendo às séries televisivas.
Pois os seriados estão para os americanos como as telenovelas estão para os brasileiros. Tirando os telejornais e os eventos esportivos são líderes de audiência, e influenciam boa parte da sociedade.
Hoje estava assistindo um episódio de uma série já extinta chamada Frasier. Para quem não conhece trata-se de uma sitcom, ou uma comédia sobre costumes.
Frasier é um psicanalista que após o divórcio retorna à sua cidade natal, Seattle, e inicia nova carreira como apresentador de um talk show de rádio onde dá conselhos à pessoas com problemas em suas vidas.
Recebe para viver com ele o pai, com quem nunca conseguiu ter uma boa relação. Martin sofreu um acidente que o deixou com problemas de locomoção e impossibilitado de viver sozinho. Os dois passam a ter uma oportunidade de entender este afastamento e criar laços de união.
No episódio que vi hoje, Frasier e seu irmão descobrem que algo aconteceu 30 anos antes em umas férias de família. Confrontado pelos filhos, Martin reconhece que teve um caso com a vizinha no período, que não se orgulha do que fez e que considera o caso encerrado.
Frasier não se conforma com a traição do pai e sofre pela memória da mãe, já falecida. Acaba descobrindo que a estória era justamente o inverso, fora sua mãe quem tivera o caso. Em nova conversa, seu pai admite que mentiu para preservar a memória da esposa.
O que achei interessante, é que a tônica dos episódios gira em torno do personagem principal enfrentando situações cotidianas e tirando importantes ensinamentos. Sim, a sociedade e os homens não são perfeitos, mas existem valores que devem ser buscados.
Da primeira temporada, este é o sétimo episódio que assisti nas duas últimas semanas. Nele foram tratados temas como o respeito mútuo entre o pai e o filho, a ética na profissão, a ironia que por vezes humilha as pessoas, e outros. Todos valores preciosos que se perdem na modernidade.
Muitos seriados americanos giram em torno da propagação destes valores. Gostamos de chamar os americanos de falso-moralistas, que não seguem o que pregam, etc. Mas o fato é que muitos dos seus programas discutem e reafirmam valores morais universais. Basta ver a quantidade de sitcons já produzidos centrados no ideal da família.
Existem os que as ridicularizam? Sim. Os que as questionam? Sim. Mas existem muitos que a defendem e a coloca como centro da vida em sociedade.
Pois dêem uma olhada em nossas novelas e nossos programas. O que predomina em quase 100% das vezes? A desmoralização destes valores e da família. Impiedosamente. E o curioso é que nos colocamos como culturalmente melhores.
Não tenho estômago mais para ver nossa televisão. Prefiro ver seriados como Frasier, que a cada episódio trata com humor e também com sensibilidade temas importantes; com boas mensagens que muitas vezes desconcertam até mesmo seu personagem principal.
Falar bem de algo que vem dos Estados Unidos é quase pedir para ser apedrejado por aqui. Existe uma crença que estão sempre errados. Se hora mostram um adultério são acusados de denegrir valores, se apresentam a fidelidade são acusados de serem moralistas. Não tem como acertar.
Certos somos nós em nossa moral tortuosa que glorifica personagens como Foguinho ou Alemão, mostrando a pobreza de valores que somos submetidos todas as vezes que ligamos a televisão.