Se os comunistas que lutaram de armas nas mãos tivessem vencido e o governo fosse deles, certamente não teriam tido as homenagens e os pagamentos que têm recebido, que já ultrapassaram mais de R$ 2 bilhões, pelo fracasso de suas guerrilhas. Homenagens de nomes de ruas e até de placas, como a que marca o local na cidade de São Paulo onde o comunista histórico Carlos Marighella, guerrilheiro e mentor do terrorismo, foi morto, na emboscada a que o levaram os seus comparsas dominicanos do convento das Perdizes, cumprindo, acovardados, ordens da polícia que os havia prendido ao descobrir que pertenciam, com codinomes inclusive, à guerrilha, no itinerário que fizeram de Cristo a Marx.
O presidente Figueiredo pensava ser a anistia a reconciliação da família brasileira, pelo esquecimento mútuo, que foi só dos vencedores. Absurdos têm sido praticados a começar pela de um amigo desde nosso relacionamento no Senado, onde fomos pares. O presidente Itamar Franco promoveu a brigadeiro um tenente, sem os cursos imprescindíveis ao generalato: aprovação em concurso para a Escola de Estado Maior e sua aprovação nela. O ato partido de um presidente que é oficial de artilharia R2 é, em si, inconcebível.
Abriu-se a porteira para as promoções dos vencidos como se heróis fossem. O eminente sociólogo Fernando Henrique Cardoso, que fora aposentado compulsoriamente como professor da USP, onde pertencia a grupos de estudo e propagação do marxismo, eleito embora com a o auxílio dos partidos que cooperaram com o ciclo militar, sancionou lei que, em vez do esquecimento com que sonhou Figueiredo, viesse a ser indenizatória dos vencidos nas guerrilhas comunistas. Ao assiná-la, disse ser o dia mais feliz de sua vida. Desde então o rio descoberto por Itamar passou a ser torrente. Criaram-se comissões de reparo e de ressarcimento, tão isentas como isento foi Torquemada na alta idade média. Enriqueceram beneficiados paradoxalmente por terem sido vencidos. Mas também por terem matado. A par disso, vieram as promoções por ressarcimento de preterição.
Luiz Carlos Prestes chefiou a Intentona de 1935, causando mortes de militares no Nordeste e no Rio de Janeiro. Passou sua vida na União Soviética servindo a Stalin e a Krushev. Dedicou-a à causa comunista, mas foi no Brasil que recebeu como recompensa a promoção a coronel com vencimentos de general. Chega-se então ao inconcebível. A um capitão desertor, assassino do segurança do embaixador americano Elbrick, que seqüestrou, e de um vigilante de banco, que assaltou, soma-se em seu currículo o roubo de armamento de sua unidade militar, o crime militar mais nefando: o de matar um refém voluntário. Cercado pelo Exército e a PM no Vale da Ribeira, surpreendeu o pelotão do tenente Mendes, da PM de São Paulo, que teve vários soldados feridos gravemente. Para conseguir evacuá-los, parlamentou com o experiente matador, oferecendo-se ficar como refém, o que foi aceito. Estreitando-se o cerco, foi condenado à morte por um “tribunal” e logo executado, de início por uma coronhada de fuzil na cabeça, dada por trás. Logo outros, com a frieza profissional dos verdugos, esfacelaram seu crânio. Dois deles estão vivos.
Àquele que trocou o juramento de defender a pátria pelo celerado que matou, sem direito à defesa, filhos do povo, segurança de embaixador e vigilante de banco, dá-se morte cruelmente. Foi um herói que se sacrificou para salvar seus comandados, confiante na honra dos militares. Carlos Lamarca não mereceu vestir a farda que vestiu na vigília da traição, e agora ganha o traje – mas não a farda – de coronel com a condecoração indelével do perjuro.
Fazem-no merecedor da honraria quem detém temporariamente o poder de transformar um réprobo em herói, um trânsfuga que, jurando dar a vida pela pátria, a ultrajou. Hoje a vilipendiam as comissões de anistia que reverenciam o ultraje. Só resta colocá-los no panteon da pátria.