Legalização da Maconha

Ontem Sérgio Cabral defendeu como medida efetiva contra a criminalidade a legalização das denominadas “drogas leves”. Na hora lembrei-me de Fernando Gabeira, que durante anos defendeu a tese.

Pois hoje Gabeira escreveu um artigo na Folha levantando as impossibilidades práticas da medida. Mais uma mostra que não se deve ficar preso às nossas convicções. Ao contrário, devemos sempre duvidar delas e nos perguntar se estamos realmente certos. Devemos buscar a evolução e não a estagnação de pensamentos.

Gabeira lembra que o exemplo da Holanda não é utilizado com propriedade. A Holanda não liberou o consumo de drogas leves, apenas o permitiu em determinados pontos de Amsterdã, sobre vigilância constante das autoridades policiais. Liberar a droga em um país vizinho a outros que a discriminam é um convite a transformar o território nacional no “fumódromo” da região, concentrando os usuários.

Segundo o deputado, a legalização só pode ser pensada após a modernização e melhoria da polícia, o que estamos longe de conseguir. Acredita-se que grande parte dos criminosos que traficam as drogas leves migrariam para outra forma de delito, normalmente o roubo de carros e seqüestro. Estaria o Brasil preparado para isso?

Em princípio sou contra a legalização, mas é um ponto que não tenho convicção formada. Já vi muita gente boa defendendo a medida ou a sua discussão, como o ex-Embaixador do Itamaraty Camillo Cortês. Acredito que a questão merece um bom debate.

Lei da Improbidade Administrativa

Encontra-se em fase de decisão no STF uma ação movida pelo ex-ministro Carlos Sardenberg. Mas o caso específico do autor nem é o mais importante, o mais importante é o mérito que está em discussão.

A Lei de Improbidade Administrativa de 1992 está sendo utilizada para processar agentes públicos, incluindo prefeitos, governadores e ministros. Segundo interpretação vigente qualquer procurador da república pode pedir abertura de processo contra um agente público, independente de autorização, por exemplo, do Congresso. Existem hoje 14.000 processos abertos, incluindo os do ex-Prefeito Paulo Maluf, Jáder Barbalho e etc.

A revista Veja apresentou matéria semana passada alertando para a eminente derrubada pelo STF desta interpretação. Depois do mensalão fica patente o corporativismo do Congresso para autorizar o processo contra um dos seus. Ainda mais um Ministro que faz parte do governo. Segundo os argumentos da revista seria mais um convite à impunidade.

Pesquisa entre os procuradores e promotores mostra que praticamente 100% deles defendem a atual interpretação e não cansam de reclamar da impunidade que a sua derrubada irá causar.

Então qual seria o problema?

O problema é que os procuradores e promotores estão utilizando a interpretação para fins no mínimo políticos. O ministro do STF Gilmar Mendes chegou a nomear hoje alguns procuradores que estão exorbitando na questão, entre eles Luis Fernando de Souza, que não passava um dia no governo FHC sem apresentar denúncia contra um agente público. Já existe processo contra ele por abuso destra prerrogativa. O ministro citou também o caso de Raul Jungman, que teria sido acusado no início do ano sem a menor prova com fins comprovadamente políticos: Jungman liderava a cruzada contra os sanguessugas.

A questão é que a abertura do processo não exige apresentação de provas, nem mesmo de direito prévio de defesa do acusado. Aliás, nem existe acusado ainda.

Mas não é só isso. Veja o que diz a lei: Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições.

Existe algo mais vago do que isso? O que seria violar a lealdade às instituições? O que seria imparcialidade? Junte isso à dispensa de apresentação de provas e o resultado são 14.000 processos abertos. Isto sim é um convite à impunidade.

É uma discussão interessante, com bons argumentos de todos os lados. Por enquanto no STF está dando 6 X 1 pela derrubada da interpretação em vigor. Se nenhum dos 6 ministros mudar o voto a questão está decidida.

Como é que é?

Assustou-me demais o anúncio terça feira que o presidente Lula desejava uma reunião semanal com os presidentes da Câmara e do Senado para discutir a pauta de votações do Legislativo. E pior, os dois concordaram! Como é que é? O chefe do executivo agora vai participar da elaboração da rotina do Legislativo? E todo mundo acha isso normal?

A democracia moderna foi pautada nos ideais do iluminismo, embrião da Revolução Francesa, que de tão importante marcou o fim de uma era. Surgindo como um contra-ponto ao absolutismo defendia o individualismo, a defesa contra o Estado autoritário. Para tanto imaginou-se um sistema onde as três funções maiores, legislar, governar e julgar fossem conferidas a grupos diferentes. Surgia os três poderes, que deveriam ser autônomos e independentes. O embate entres os três serviria como contraponto a uma tentativa de esmagar um indivíduo pelo poder do Estado. Rosseau já alertava que a ditadura pressupunha o rompimento deste equilíbrio, ou o domínio de um poder pelo outro.

E assim se iniciaram as ditaduras do século XX, com a submissão de um poder (normalmente o lesgislativo) por outro (executivo). O judiciário passava naturalmente ao controle do ditador e estava instalado o autoritarismo. Nada é mais importante para a democracia do que este equilíbrio, e por isso me assusta o silêncio mórbido com que esta notícia tem sido tratada até aqui.

Paranóia? Exagero? Não é isto que a história ensina, e não é isso que estamos vendo hoje (Venezuela e Bolívia). Existe em marcha um surto de autoritarismo, ameaçando a democracia, que já é abertamente questionada na América Latina. E o final desta estória já se conhece. Não é nada boa.

20 anos

Muito interessante o artigo de Carlos Alberto Sardenberg no Globo de hoje como o título de Marx não havia morrido?

O ponto de partida é um e-mail de um aluno do curso de direito da USP que relatava a fala de um professor em sala de aula. O professor “explicava” por que Antonio Ermírio de Moraes é rico e seus empregados são pobres.

Segundo o professor era “por causa da exploração capitalista que ele exerce sobre a mão-de-obra. Por isso é necessário um legislação trabalhista que proteja os empregados e obrigue o capitalista a gastar parte de seus lucros com os direitos trabalhistas”.

É a defesa da tese de Marx segundo o qual o operariado era destinado à opressão e à pobreza até que faça a revolução do proletariado.

O grande problema é a realidade. No século passado vários países fizeram a revolução. Nos que permaneceram capitalistas, a classe operária cresceu, melhorou de vida e conqusitou direitos. Foi gerada uma classe média que se tornou dominante. A idéia é participar do lucro, não eliminá-lo.

Nos países socialistas os trabalhadores continuaram assalariados e o regime revelou-se incapaz de gerar riquezas. E perdeu-se a liberdade.

Há algum tempo que vem ficando claro para mim que o Brasil está pelo menos 20 anos atrasado em relação ao mundo. E não apenas tecnologicamente. Ainda se discute e ,pior, se defende o socialismo que o mundo civilizado já refutou há anos. E que deu errado. Basta perguntar aos operários da antiga Alemanha Oriental. Basta relembrar a festa que fizeram quando o muro foi derrubado e foi possível a entrada no mundo capitalista.

O único consolo é que talvez daqui a 20 anos cheguemos onde o mundo está hoje, com o socialismo sepultado e as conquistas do livre mercado consolidadas. Talvez