Mais sobre plebiscitos

Merval Pereira, em seu artigo de domingo no Globo, trata da questão da proposta de Tarso Genro de “exacerbação da consulta, do referendo, do plebiscito e de outras formas de participação“, como já defendia em seu livro A Esquerda em Processo. Um grupo de parlamentares petistas apresentou um proposta concreta para que o Presidente da República possa propô-los, sem intermediação do Congresso.

O autor afirma que a crise que o Congresso se afunda favorece este tipo de questionamento da democracia representativa, que já está em curso em países como a Venezuela e a Bolívia. Apresenta também que os liberais estão insatisfeitos com a democracia da massa, que “seria passível de manipulação da massa, que seria passível de manipulação por políticos populistas“. Para os liberais a idéia seria o fim do voto obrigatório.

A Suiça é sempre citada como exemplo e já foram realizados 150 consultas nacionais desde 1849. Nos Estados Unidos a prática é apenas local, tratando de diversos temas. “Quanto maior o país, menor a possibilidade de haver plebiscitos ou referendos nacionais” .

Merval cita o cientista político Bolívar Lamounier que afirma ter esta utopia muito pouco de “direta”: “A possibilidade de manipulação é inerente ao instrumento, pois a autoridade incubida de propor os quesitos pode ficar muito aquém da neutralidade“.

O autor conclui que antes de se decretar a falência da democracia representativa é preciso organizar o sistema político-partidário, e a volta da cláusula de barreira e a fidelidade partidária seria o inicio deste caminho.

Governo Lula: por que não acreditava e não acredito

Quando Lula conseguiu seu segundo mandato uma colega me disse que não podia ficar torcendo contra o país, que tinha que torcer para o Lula dar certo. Na época disse que não era questão de torcer, isto é para futebol, era questão de analisar o que aconteceu, o que o presidente pensa e constatar que seria um atraso (na melhor das hipóteses) a re-eleição de Lula.

Não é mais segredo para ninguém que o mandato de quatro anos se constrói no primeiro ano, mais precisamente nos 9 primeiros meses. É quando o presidente, respaldado pelo apoio popular, tem a boa vontade do congresso para aprovar as medidas cruciais para que seu governo funcione. Depois aumenta o desgaste, os parlamentares já miram as eleições municipais. No segundo e terceiro anos de governo só se pode fazer ajustes pontuais, corrigindo a direção que foi dada no primeiro ano.

No último não se faz mais nada. A máquina vira-se toda para as eleições, o que ainda é mais grave se o presidente já está no segundo mandato e não pode mais concorrer.

Portanto, para funcionar bem o governo tem que aproveitar os primeiros 9 meses para aprovar seus planos para o governo. Pois estamos entrando no terceiro mês e o que aconteceu?

Na principal promessa de campanha, o crescimento econômico, rigorosamente nada. Foi parido um plano pífio, mais propaganda de marketing do que qualquer outra coisa, denominado (com rara sabedoria) de PAC. É um dos trocadilhos mais bem bolado dos últimos anos. Usa-se para Empacado, Pactóide, etc.

A reforma política já foi engavetada de vez, e as propostas que estão por aí visam mais resguardar os grandes partidos das interpretações do STF e TSE que dão benefícios absurdos para legendas de aluguel. O que se imaginava que iria melhorar com a cláusula de barreira já foi para o brejo.

Nem o ministério está perto de ser formar. Parece besteira, mas não é. Quase todos os ministros estão parados preocupados em conseguir se manter nos cargos e jogando suas fichas nas negociações políticas. Suas pastas estão às moscas. E o presidente não parece preocupado.

Se alguém acreditava que o PT tinha aprendido com a crise do mensalão pode desistir. As mesmas práticas voltaram a tona com tudo na eleição do Presidente da Câmara e já se fala abertamente na volta de Dirceu. Para que não sei. Já está mandando uma barbaridade mesmo sem direitos políticos. Aliás os três partidos que compuseram o mensalão com o PT já estão juntos novamente. Agora com o PMDB.

O tempo está passando e nada de concreto se apresentou para avançar na solução dos problemas do Brasil. Aliás aconteceu ao contrário. O presidente já falou que não há problema com as contas da previdência (é questão social), aceitou o calote da Bolívia (ainda bem que o índio de araque não pediu o Acre), respaldou uma ditadura (Venezuela), disse que a violência se combate com empregos e educação e já tirou mais de vinte dias de férias em um período de menos de 2 meses.

A única coisa que vi funcionar até agora foi o convênio inédito entre o MST e a CUT. Já rendeu até invasões de terra e São Paulo e Minas Gerais. Com anuência do Ministro da Reforma Agrária.

Torcer como num quadro destes?

Só posso torcer para estes 4 anos passarem depressa e os brasileiros pensarem um pouquinho melhor em quem apostar sua fichas.

Mas que o atual governo vai ser um fracasso retumbante não tenho a menor dúvida.

Irã Atômico

A coisa está cada vez pior no Oriente Médio. E ficaria muito pior com armas nucleares na confusão. Digo ficaria, porque não ficará. Não existe a menor possibilidade de Israel deixar que os iranianos desenvolvam estes artefatos. Com ou sem sanção da ONU. É questão de sobrevivência.

Desde a criação de Israel que os estados árabes e o Irã (que não é árabe) tem como objetivo nacional permanente varrer o país judeu da face da terra. Não é recuperar os territórios palestinos, é varrer literalmente os israelenses do Oriente Médio. Como não há possibilidade de conseguir este objetivo com guerra convencional utilizam extensamente o terrorismo enquanto esperam ter nas mãos uma “bomba sagrada”.

É claro que os Estados Unidos apoiarão Israel na empreitada. E parece claro que franceses, alemães e russos vão protestar, um pouco mais leve desta vez pois sabem que o Irã realmente não pode ter armas nucleares. As esquerdas mundiais farão uma cruzada contra o “imperialismo americano”, com tudo que tem direito. Mas como sempre será incapaz de propor uma solução para o problema. Talvez porque desta vez não tenha.

A guerra é inevitável? Não. Mas depende mais do Irã do que da comunidade internacional e da ONU. Israel não tem escolha nesta. Não adianta devolver os terrenos palestinos como querem muitos, não resolve o problema. Ou o Irã desiste da bomba santa ou Israel ataca. O que mais podem fazer os israelenses? Apelar para o bom senso dos Aiatolás?

O Mossad já trabalha com a informação de que no ritmo atual a bomba estará pronta em 2009. A associação Internacional de Energia Atômica admite que o Irão não tem seguido as recomendações e pelo contrário, tem acelerado seu programa. Tem que ser muito iludido (ou não) para imaginar que os propósitos iranianos são pacíficos. Energia não é problema para uma nação montada sobre um reserva gigante de petróleo.

Estamos chegando numa encruzilhada. Desta vez França, Rússia, China e Alemanha vão ter que tomar uma atitude firme. É melhor para todo mundo que a questão seja mediada pelo Conselho de Segurança da ONU, embora quase destruído pela invasão americana no Iraque. Pois a alternativa é Israel e Estados Unidos bombardearem o Irã. E eles não têm outra escolha.

Combate à Violência

O Ministro da Justiça afirmou ontem que a violência se combate com empregos e educação. É uma destas teses que se gosta de repetir pela mídia, que a violência é fruto da grande desigualdade social que existe no país. Não parece que seja tão simples quanto MTB gosta de afirmar.

Os dados sobre a desigualdade social indicam que não houve muita variação nos últimos 30 anos. Estamos estagnados. Recente reportagem da Veja indica que a classe média cresceu muito pouco nos últimos 20 anos. Se houve alguma mudança, e muito pequena, foi para melhor. Nossos índices sociais melhoraram um pouco nas últimas décadas.

Quando se cruza estes dados com os índices de violência a incoerência se mostra de cara. Estes índices dispararam. Temos um quadro em que os índices sociais se mantém e a violência não para de aumentar. Onde está a relação de causa e efeito? Como explicar o caso em que jovens de classe média alta de Brasília atearam fogo em um índio para superar o tédio?

No início dos anos 90 os Estados Unidos estavam explodindo com a violência urbana em suas grandes cidades. Iniciou-se um processo para combatê-la. Atuaram também na prevenção, com palestras em escolas públicas, projetos de prática de esportes para jovens e coisa do gênero. Mas não foram estas as principais medidas para combater a violência. Estas foram as ações secundárias.

As principais foram modernização da polícia e agilização no combate ao crime. Novas penitenciárias foram construídas e a justiça passou a agir com mais rapidez e rigor. Na última década a população carcerária americana aumentou em cerca de 40%. O que deve causar surpresa para os sociólogos brasileiros é que a violência decresceu mais ou menos na mesma proporção. Não conseguem conceber que se diminua a violência simplesmente… prendendo os criminosos!

Quando os dados americanos foram divulgados em 2003 (se não me falha a memória) o mesmo Márcio Thomaz Bastos afirmou que este modelo não servia para o Brasil. Que o sucesso de um programa de combate à violência é medido pela diminuição da população carcerária e não ao contrário. Na lógica do Ministro para vencer o crime deve-se… soltar os criminosos! Não é à toa que é um advogado criminalista, dos bons.

Para não ficar só no exemplo dos States (que os brasileiros, na média, desprezam) vamos para São Paulo. Durante o governo Covas-Alckmin os presídios paulistas ficaram lotados, aliás superlotados. O que provocou rebeliões e os ataques do PCC. Falência do sistema? Nem tanto. Dados do próprio IBGE (que o governo segurou por causa das eleições) mostram que a violência recuou sensivelmente no estado.

Mas só sei citar exemplo do PSDB e dos Estados Unidos no combate ao crime? Queriam o que? Exemplos do governo do PT? Sorry.

De onde menos se espera é que não vem nada mesmo.

Plebiscitos

Quem está atento aos noticiários percebeu que existe um movimento liderado pelo PT para aumentar o número de plebiscitos no país. É lógico que a primeira coisa que me veio a cabeça foi o exemplo de Hugo Chavez que usou a prática para se transformar em uma espécie de ditador democrático, se é que esta coisa existe. A suspeita aumenta ainda mais quando a idéia é que o presidente possa convocar plebiscitos sem a anuência do congresso. Lula II sabe que é mais fácil aprovar uma re-reeleição pelo voto popular do que no senado. O bolsa-família é uma moeda mais barata e segura, vide as últimas eleições.

Mas por outro lado, o plebiscito é sim uma expressão da vontade popular. A questão é até onde um povo pode diretamente decidir seu próprio destino. Até que ponto não estaremos dando a uma criança de 5 anos a decisão se deve comer balas o dia inteiro ou não. Por pior que seja a elite política, e a nossa é da pior espécie, ainda é uma elite. Resta um tiquinho de responsabilidade. O que daria no plebiscito a pergunta se devemos pagar impostos ou não?

Mas isto é questão filosófica, que dá muita discussão ainda. Vamos à prática. Citaram o Estados Unidos como exemplo da utilização em massa de plebiscitos. Toda vez que um petista cita os americanos como exemplo de alguma coisa fico preocupado. É como se desejassem dar uma aura de “direita”, como para provar que não é um radicalismo. Normalmente o exemplo vem distorcido e esta não é uma exceção. Os plebiscitos americanos são locais e realizados durante as eleições. Argumentam que podemos fazer durante as eleições também. Junto com a eleição do Presidente, Governador, Senador, Deputado Federal e Deputado Estadual. Viram a confusão? Se nas últimas eleições eu, que procuro manter-me informado, não tinha um nome para este último cargo, imagina a galera? Vai tacar 5 xis e ainda vai decidir sobre uma questão importante?

Mesmo assim sei lá. Ir contra o plebiscito parece-me anti-democrático. Vamos supor que no final das contas seja uma boa coisa. Afinal o PT quer que o povo decida não é? Pois que tal o povo decidir as seguintes questões:

  1. Você é a favor do fim do regime de progressão penal para crimes hediondos?
  2. Você é a favor do pagamento da CPMF?
  3. Você acha que um membro do MST deva ser processado por invasão de propriedade privada e destruição de patrimônio público? E por assassinato?
  4. Você é a favor que o Estado continue pagando indenizações milionárias para perseguidos políticos que nunca passaram uma noite na prisão?
  5. Você é a favor da redução da maioridade penal? E da prisão perpétua? Morte?
  6. Você é a favor que o imposto sobre o combustível (CIDE) deva efetivamente ser utilizado no fim a que se destina: investimentos em infra-estrutura?
  7. Você é a favor do voto secreto no congresso?
  8. Aborto? Casamento de homossexuais? Cotas?
  9. Você acha mais importante utilizar recursos públicos para gerar empregos ou para promover filmes culturais?
  10. Você concorda que o governo possa contigenciar recursos para segurança pública?

Não pode? Por que? O povo não tem responsabilidade para decidir questões como esta? Mas pode decidir se o Lula II pode se transformar em Lula III? Tá bom.

A verdade é que a média do brasileiro não processa a ideologia das nossas esquerdas. Somos de certa forma um país de conservadores. O que é bom e é ruim, dependendo do aspecto. Mas o fato é que se o eleitor pudesse opinar diretamente muitos bastiões petistas cairiam por terra. Eles não querem o plebiscitos. Querem é o controle sobre plebiscitos. O que é bem diferente.

Degradante

By ClaudioHumberto

O tratamento solene de alguns dos principais veículos de comunicação do País aos bicheiros que controlam as escolas de samba do Rio de Janeiro, mencionados – com reverência – como “presidentes”, revela um sintoma grave: a relação promíscua entre a sociedade carioca e os criminosos. O mesmo tipo de relacionamento que impede o Rio de Janeiro de chamar pelo nome correto o mais grave problema que aflige o Estado: o crescente domínio da criminalidade. Talvez por temor de ofender o vizinho, o amigo do filho, o tia da amiga. Mesmo após o cruel assassinato do garotinho João Hélio, em vez de denunciar os assassinos e exigir o combate ao crime e ao tráfico de drogas, os cariocas fazem passeatas babacas, convenientemente genéricas, “pela paz” e pelo fim “da violência”. Meter o dedo na cara do crime, que é bom, nada.

Estava comentando isso antes. O desfile de escolas de samba do Rio de Janeiro é notoriamente um espetáculo de lavagem de dinheiro a céu aberto. O que fazemos? Transformamos este espetáculo em turismo e a principal rede de televisão do país o transmite na íntegra durante toda a noite.

O método mais eficaz de combater o crime organizado é começar pela lavagem de dinheiro. Se o criminoso não tiver como legalizar o produto de seu crime seu serviço se torna ineficaz. E na lavagem que se prenderam os grandes gangsters americanos (vide Al Capone) e a máfia italiana. Mas nosso fisco só sabe ir em cima dos pobres mortais.

Outro dia a receita autuou alguns mensaleiros. Vai dar em multa e fica por isso mesmo. Nos Estados Unidos seria o suficiente para colocá-los atrás das grades. Não precisaria nem provar o mensalão.

Mas no Brasil é assim. Celebramos o crime. Em rede nacional. Querem protestar contra violência, por que ao invés de fazer passeata inútil não boicotam o sambódromo? Seria muito mais efetivo e mais eficaz.

Mas quem quer trocar a diversão por uma boa causa?